Ã? maneira de Martin Luther King, o mais conhecido líder pelas conquistas sociais para os negros americanos, também tenho um sonho, que suponho não seja apenas meu.
POR Redação SRzd15/06/2006|4 min de leitura
Ã? maneira de Martin Luther King, o mais conhecido líder pelas conquistas sociais para os negros americanos, também tenho um sonho, que suponho não seja apenas meu.
POR Redação SRzd15/06/2006|4 min de leitura
É maneira de Martin Luther King, o mais conhecido líder pelas conquistas sociais para os negros americanos, também tenho um sonho, que suponho não seja apenas meu. Sonho banal, prosaico até, diria. Como gosto de andar pela cidade, conhecer gente nova, descobrir os jeitos originais que toda urbe reserva a quem não se furta a caminhar, adoraria subir o Salgueiro, a Formiga, o São José Operário ou a Coroa, entre tantas outras comunidades que o Rio de Janeiro tem. E das quais a gente só ouve falar, como naquele verso do samba cantado pelo Zeca Pagodinho sobre o caviar.
Sei que o meu sonho é muito difícil de realizar e que os principais algozes dele moram do lado de cá. Podem ser vizinhos meus que em discussões defenderam posições óbvias, típicas dessas ocasiões, enquanto tomávamos um chope no bar da esquina. São tidos como cidadãos de bem, morando em condomínios cujo valor da mensalidade é salgado para o salário de professor.
Quando, de minha varanda, de binóculos, observo meninos e rapazes jogando pelada, lá em cima no Morro da Cruz, ou ouço a moça da limpeza contar como canta bem a companheira de culto, acompanhada apenas do violão de um certo Mestre João, minha vontade de subir a comunidade e olhar a vida de lá só faz aumentar.
Mas quem é louco de subir, de entrar, se não for de lá, sistema que impera há mais de uma década nesses lugares!?
Sei que tem havido um “tsunami” evangélico nessas comunidades, o que tem modificado o jeito de ser e de enfrentar a vida, mas será que, além dos cultos e dos bailes funk, ainda há rodas de samba por lá, começando num dia e indo até amanhecer outro?
Claro que quando a Tijuca é despertada pelo matraquear das metralhadoras e a sinfonia amedrontadora dos grossos calibres, momentaneamente a razão encobre como uma névoa o meu sonho, mas logo que o silêncio volta também retorna o desejo de subir, de olhar, de ver como se vive por lá. Como será que a torcida pelo hexa por lá se organiza e torce!?
Há alguns anos, acompanhávamos o rescaldo de uma disputa por territórios no Turano, logo ali no começo da Grajaú-Jacarepaguá. Subimos o morro acompanhados pela Polícia Civil e o grupo de repórteres não teve como não se entreolhar: domingo, meio da manhã, e uma lavadeira, trabalhando embaixo da sombra de uma mangueira, cantava um lamento com voz de tom aveludado tão suave e triste, que marcou para sempre aquele momento.
Não vou gastar minhas preciosas linhas reclamando da falta de ação do governo nesses lugares, porque a gente já sabe como é que ele se faz presente nessas comunidades.
Está aí o livro “Elite da tropa”, que não nos deixa mentir. E se apenas a polícia entra nos morros e favelas é porque todo o restante do governo, principalmente o municipal, não está nem aí para essas comunidades, como se ali não houvesse gente. São cidadãos que moram lá, os principais produtores da cultura, matriz da alegria e descontração que tomam conta dessa cidade, apesar da dor da qual eles são sujeitos preferenciais.
De uma coisa eu sei: já que estamos com a Alemanha em foco, por conta da Copa do Mundo, que tal imitar os alemães em relação ao Muro de Berlim, e dinamitarmos a hipocrisia, descriminalizar o uso das drogas ilícitas? Se, pelo menos, discutíssemos este assunto de forma conseqüente, já seria meio caminho andado em direção a um sonho que não é só meu.
Mais do que um sonho, o que está em jogo é o direito de ir e vir, assegurado apenas na letra morta da nossa Constituição.
Edmilson Silva é jornalista
É maneira de Martin Luther King, o mais conhecido líder pelas conquistas sociais para os negros americanos, também tenho um sonho, que suponho não seja apenas meu. Sonho banal, prosaico até, diria. Como gosto de andar pela cidade, conhecer gente nova, descobrir os jeitos originais que toda urbe reserva a quem não se furta a caminhar, adoraria subir o Salgueiro, a Formiga, o São José Operário ou a Coroa, entre tantas outras comunidades que o Rio de Janeiro tem. E das quais a gente só ouve falar, como naquele verso do samba cantado pelo Zeca Pagodinho sobre o caviar.
Sei que o meu sonho é muito difícil de realizar e que os principais algozes dele moram do lado de cá. Podem ser vizinhos meus que em discussões defenderam posições óbvias, típicas dessas ocasiões, enquanto tomávamos um chope no bar da esquina. São tidos como cidadãos de bem, morando em condomínios cujo valor da mensalidade é salgado para o salário de professor.
Quando, de minha varanda, de binóculos, observo meninos e rapazes jogando pelada, lá em cima no Morro da Cruz, ou ouço a moça da limpeza contar como canta bem a companheira de culto, acompanhada apenas do violão de um certo Mestre João, minha vontade de subir a comunidade e olhar a vida de lá só faz aumentar.
Mas quem é louco de subir, de entrar, se não for de lá, sistema que impera há mais de uma década nesses lugares!?
Sei que tem havido um “tsunami” evangélico nessas comunidades, o que tem modificado o jeito de ser e de enfrentar a vida, mas será que, além dos cultos e dos bailes funk, ainda há rodas de samba por lá, começando num dia e indo até amanhecer outro?
Claro que quando a Tijuca é despertada pelo matraquear das metralhadoras e a sinfonia amedrontadora dos grossos calibres, momentaneamente a razão encobre como uma névoa o meu sonho, mas logo que o silêncio volta também retorna o desejo de subir, de olhar, de ver como se vive por lá. Como será que a torcida pelo hexa por lá se organiza e torce!?
Há alguns anos, acompanhávamos o rescaldo de uma disputa por territórios no Turano, logo ali no começo da Grajaú-Jacarepaguá. Subimos o morro acompanhados pela Polícia Civil e o grupo de repórteres não teve como não se entreolhar: domingo, meio da manhã, e uma lavadeira, trabalhando embaixo da sombra de uma mangueira, cantava um lamento com voz de tom aveludado tão suave e triste, que marcou para sempre aquele momento.
Não vou gastar minhas preciosas linhas reclamando da falta de ação do governo nesses lugares, porque a gente já sabe como é que ele se faz presente nessas comunidades.
Está aí o livro “Elite da tropa”, que não nos deixa mentir. E se apenas a polícia entra nos morros e favelas é porque todo o restante do governo, principalmente o municipal, não está nem aí para essas comunidades, como se ali não houvesse gente. São cidadãos que moram lá, os principais produtores da cultura, matriz da alegria e descontração que tomam conta dessa cidade, apesar da dor da qual eles são sujeitos preferenciais.
De uma coisa eu sei: já que estamos com a Alemanha em foco, por conta da Copa do Mundo, que tal imitar os alemães em relação ao Muro de Berlim, e dinamitarmos a hipocrisia, descriminalizar o uso das drogas ilícitas? Se, pelo menos, discutíssemos este assunto de forma conseqüente, já seria meio caminho andado em direção a um sonho que não é só meu.
Mais do que um sonho, o que está em jogo é o direito de ir e vir, assegurado apenas na letra morta da nossa Constituição.
Edmilson Silva é jornalista
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