Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd Na noite do último domingo (5), a comunidade hollywoodiana iniciou, oficialmente, a temporada de premiações com a 82ª edição do Globo de Ouro, historicamente, a segunda maior festa da comunidade hollywoodiana e um dos principais termômetros para a estatueta dourada que todos almejam conquistar ao final […]
POR Ana Carolina Garcia07/01/2025|8 min de leitura
Perfil do Globo de Ouro exalta Fernanda Torres. Foto: Reprodução/X
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Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd
Na noite do último domingo (5), a comunidade hollywoodiana iniciou, oficialmente, a temporada de premiações com a 82ª edição do Globo de Ouro, historicamente, a segunda maior festa da comunidade hollywoodiana e um dos principais termômetros para a estatueta dourada que todos almejam conquistar ao final do arco-íris, ou seja, o Oscar, cujos indicados serão anunciados no próximo dia 17. E os grandes vencedores da noite foram “O Brutalista” (The Brutalist – 2024, EUA / Reino Unido / Canadá) e “Emilia Pérez” (Emilia Pérez – 2024, França / Bélgica / México), agraciados com as respectivas estatuetas de melhor filme de drama e melhor filme de comédia / musical.
O reconhecimento desses dois títulos pela Golden Globe Foundation começa a delinear a temporada de premiações americana. Contudo, para os brasileiros que entraram a madrugada desta segunda-feira sentados em frente à televisão numa torcida em clima de final de campeonato de futebol, a ansiedade girava em torno das indicações de “Ainda Estou Aqui” (Ainda Estou Aqui – 2024, Brasil / França) nas categorias de melhor filme em língua não-inglesa e atriz em filme de drama para Fernanda Torres.
Dirigido por Walter Salles, “Ainda Estou Aqui” foi derrotado por “Emilia Pérez”, original Netflix, na disputa de melhor filme em língua não-inglesa, jogando, de certa forma, um balde de água fria nos torcedores / fãs brasileiros, que há 26 anos, desde a indicação da veterana Fernanda Montenegro, mãe de Fernanda Torres, por “Central do Brasil” (Central do Brasil – 1998, Brasil / França), também de Salles, sonhavam em ver um(a) conterrâneo(a) ser reconhecido(a) por seu talento e competência na tela grande.
E o momento tão esperado chegou pouco antes da 1h da manhã desta segunda-feira, quando Viola Davis, a homenageada deste ano com o Cecil B. DeMille Award, prêmio concedido pelo conjunto da obra, subiu ao palco para entregar a estatueta de melhor atriz em filme de drama. Para a surpresa de parte considerável da plateia, Davis anunciou Fernanda Torres, cravando seu nome na História de Hollywood como a primeira brasileira a vencer essa estatueta.
“Meu Deus, eu não preparei nada, porque não sei se estava pronta. Esse foi um ano incrível para os desempenhos de atrizes, tantas atrizes aqui que eu admiro tanto. E, claro, quero agradecer ao Walter Salles, meu parceiro, meu amigo. Que história, Walter. E, é claro, quero dedicar esse prêmio à minha mãe. Vocês não têm ideia, ela estava aqui há 25 anos, e isso é uma prova que a arte dura na vida, até durante momentos difíceis pelos quais a Eunice Paiva passou e com tanto problema hoje em dia no mundo, tanto medo. Esse é um filme que nos ajudou a pensar em como sobreviver em tempos como esses. Então, para a minha mãe, para a minha família, para o Andrucha, para o Selton, meus filhos. E para todos, muito obrigada ao Globo de Ouro, Michael Parker, Mara, tantas pessoas. Muito obrigada!”, disse Torres, surpresa e emocionada, no palco.
Não há como negar o fato de a vitória de Torres, que há 39 anos se tornou a primeira brasileira a vencer a Palma de Ouro de melhor atriz no Festival de Cannes por seu desempenho em “Eu Sei Que Vou Te Amar” (Eu Sei Que Vou Te Amar – 1986, Brasil), empatada com Barbara Sukowa por “Rosa Luxemburgo” (Rosa Luxemburg – 1986, Alemanha Ocidental / Tchecoslováquia), surpreendeu Hollywood sobretudo pelo peso das outras concorrentes: Nicole Kidman por “Babygirl” (Babygirl – 2024, Países Baixos / EUA), Angelina Jolie por “Maria Callas” (Maria Callas – 2024, Itália / Alemanha / Chile / EUA), Kate Winslet por “Lee” (Lee – 2024, Reino Unido / EUA / Austrália / Singapura / Hungria), Tilda Swinton por “O Quarto ao Lado” (The Room Next Door – 2024, Espanha / EUA) e Pamela Anderson por “The Last Showgirl” (The Last Showgirl – 2024, EUA). Poucos contavam com uma vitória da brasileira, a única das seis indicadas a se sentar mais distante do palco – Nicole Kidman, por exemplo, estava a poucos passos da escada de acesso.
Obviamente, a conquista do Globo de Ouro coloca Fernanda Torres numa posição confortável na corrida por uma vaga entre as cinco finalistas do Oscar. Caso consiga, Torres provavelmente terá como forte adversária a veterana Demi Moore, que venceu o Globo de Ouro de melhor atriz em filme de comédia / musical por “A Substância” (The Substance – 2024, Reino Unido / França / EUA). Mas qualquer predição acerca do Oscar só poderá ser feita, de fato, após o anúncio dos indicados e a cerimônia de entrega do SAG Awards, um dos maiores termômetros das categorias de atores, principais e coadjuvantes, concedido pelo Sindicato dos Atores dos Estados Unidos (Screen Actors Guild – SAG), agendada para 23 de fevereiro.
Enquanto Hollywood celebrava o cinema e a televisão na cerimônia de entrega do Globo de Ouro, os brasileiros comemoravam o que, para muitos, é considerado uma reparação histórica à derrota de Fernanda Montenegro tanto no Globo de Ouro quanto no Oscar em 1999 para Cate Blanchett por “Elizabeth” (Elizabeth – 1998, Reino Unido) e Gwyneth Paltrow por “Shakespeare Apaixonado” (Shakespeare in Love – 1998, Reino Unido / EUA). Contudo, chamar a vitória de Torres de “reparação histórica” é o mesmo que impor a ela a sombra de sua mãe, o que não faz sentido algum considerando o talento e versatilidade de ambas as atrizes. Mãe e filha brilham igualmente, juntas ou separadas, e disputaram em cenários completamente distintos. Afinal, há 26 anos, a indústria hollywoodiana era menos receptiva a profissionais e produções de países de língua não-inglesa.
Desde o Oscar 2016, popularmente chamado de #OscarSoWhite (“Oscar tão branco”, numa tradução literal), a comunidade hollywoodiana tem sido pressionada a implementar mudanças significativas em seu modus operandi, sobretudo no que tange às instituições responsáveis pela entrega de prêmios, o que contribuiu para levar a própria HFPA à ruína enquanto a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) tentava se ajustar gradualmente às demandas da sociedade.
Atualmente concedido pela Golden Globe Foundation, que substituiu a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (Hollywood Foreign Press Association – HFPA), dissolvida há dois anos após escândalo que colocou em xeque sua credibilidade devido, dentre tantos fatores, à falta de diversidade, representatividade e inclusão entre seus membros, o Globo de Ouro realizou uma cerimônia calcada nesses três temas, reconhecendo profissionais e títulos diversos. Isso pode ser observado, ainda, na primeira indicação de uma mulher trans à estatueta de melhor atriz em filme de comédia / musical, a espanhola Karla Sofía Gascón por “Emilia Pérez”, e na vitória de “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão” (Shogun – desde 2024, EUA), série que venceu as quatro estatuetas a que concorria: melhor série de drama, ator em série de drama para Hiroyuki Sanada, atriz em série de drama para Anna Sawai e ator coadjuvante em série de TV para Tadanobu Asano.
Sobre Ana Carolina Garcia: Formada em Comunicação Social e pós-graduada em Jornalismo Cultural, Ana Carolina Garcia é autora dos livros “A Fantástica Fábrica de Filmes – Como Hollywood se tornou a capital mundial do cinema” (2011), “Cinema no século XXI – Modelo tradicional na Era do Streaming” (2021) e “100 anos do Império Disney: Da Avenida Kingswell à conquista do universo” (2023). É vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ) desde 2021.
Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd
Na noite do último domingo (5), a comunidade hollywoodiana iniciou, oficialmente, a temporada de premiações com a 82ª edição do Globo de Ouro, historicamente, a segunda maior festa da comunidade hollywoodiana e um dos principais termômetros para a estatueta dourada que todos almejam conquistar ao final do arco-íris, ou seja, o Oscar, cujos indicados serão anunciados no próximo dia 17. E os grandes vencedores da noite foram “O Brutalista” (The Brutalist – 2024, EUA / Reino Unido / Canadá) e “Emilia Pérez” (Emilia Pérez – 2024, França / Bélgica / México), agraciados com as respectivas estatuetas de melhor filme de drama e melhor filme de comédia / musical.
O reconhecimento desses dois títulos pela Golden Globe Foundation começa a delinear a temporada de premiações americana. Contudo, para os brasileiros que entraram a madrugada desta segunda-feira sentados em frente à televisão numa torcida em clima de final de campeonato de futebol, a ansiedade girava em torno das indicações de “Ainda Estou Aqui” (Ainda Estou Aqui – 2024, Brasil / França) nas categorias de melhor filme em língua não-inglesa e atriz em filme de drama para Fernanda Torres.
Dirigido por Walter Salles, “Ainda Estou Aqui” foi derrotado por “Emilia Pérez”, original Netflix, na disputa de melhor filme em língua não-inglesa, jogando, de certa forma, um balde de água fria nos torcedores / fãs brasileiros, que há 26 anos, desde a indicação da veterana Fernanda Montenegro, mãe de Fernanda Torres, por “Central do Brasil” (Central do Brasil – 1998, Brasil / França), também de Salles, sonhavam em ver um(a) conterrâneo(a) ser reconhecido(a) por seu talento e competência na tela grande.
E o momento tão esperado chegou pouco antes da 1h da manhã desta segunda-feira, quando Viola Davis, a homenageada deste ano com o Cecil B. DeMille Award, prêmio concedido pelo conjunto da obra, subiu ao palco para entregar a estatueta de melhor atriz em filme de drama. Para a surpresa de parte considerável da plateia, Davis anunciou Fernanda Torres, cravando seu nome na História de Hollywood como a primeira brasileira a vencer essa estatueta.
“Meu Deus, eu não preparei nada, porque não sei se estava pronta. Esse foi um ano incrível para os desempenhos de atrizes, tantas atrizes aqui que eu admiro tanto. E, claro, quero agradecer ao Walter Salles, meu parceiro, meu amigo. Que história, Walter. E, é claro, quero dedicar esse prêmio à minha mãe. Vocês não têm ideia, ela estava aqui há 25 anos, e isso é uma prova que a arte dura na vida, até durante momentos difíceis pelos quais a Eunice Paiva passou e com tanto problema hoje em dia no mundo, tanto medo. Esse é um filme que nos ajudou a pensar em como sobreviver em tempos como esses. Então, para a minha mãe, para a minha família, para o Andrucha, para o Selton, meus filhos. E para todos, muito obrigada ao Globo de Ouro, Michael Parker, Mara, tantas pessoas. Muito obrigada!”, disse Torres, surpresa e emocionada, no palco.
Não há como negar o fato de a vitória de Torres, que há 39 anos se tornou a primeira brasileira a vencer a Palma de Ouro de melhor atriz no Festival de Cannes por seu desempenho em “Eu Sei Que Vou Te Amar” (Eu Sei Que Vou Te Amar – 1986, Brasil), empatada com Barbara Sukowa por “Rosa Luxemburgo” (Rosa Luxemburg – 1986, Alemanha Ocidental / Tchecoslováquia), surpreendeu Hollywood sobretudo pelo peso das outras concorrentes: Nicole Kidman por “Babygirl” (Babygirl – 2024, Países Baixos / EUA), Angelina Jolie por “Maria Callas” (Maria Callas – 2024, Itália / Alemanha / Chile / EUA), Kate Winslet por “Lee” (Lee – 2024, Reino Unido / EUA / Austrália / Singapura / Hungria), Tilda Swinton por “O Quarto ao Lado” (The Room Next Door – 2024, Espanha / EUA) e Pamela Anderson por “The Last Showgirl” (The Last Showgirl – 2024, EUA). Poucos contavam com uma vitória da brasileira, a única das seis indicadas a se sentar mais distante do palco – Nicole Kidman, por exemplo, estava a poucos passos da escada de acesso.
Obviamente, a conquista do Globo de Ouro coloca Fernanda Torres numa posição confortável na corrida por uma vaga entre as cinco finalistas do Oscar. Caso consiga, Torres provavelmente terá como forte adversária a veterana Demi Moore, que venceu o Globo de Ouro de melhor atriz em filme de comédia / musical por “A Substância” (The Substance – 2024, Reino Unido / França / EUA). Mas qualquer predição acerca do Oscar só poderá ser feita, de fato, após o anúncio dos indicados e a cerimônia de entrega do SAG Awards, um dos maiores termômetros das categorias de atores, principais e coadjuvantes, concedido pelo Sindicato dos Atores dos Estados Unidos (Screen Actors Guild – SAG), agendada para 23 de fevereiro.
Enquanto Hollywood celebrava o cinema e a televisão na cerimônia de entrega do Globo de Ouro, os brasileiros comemoravam o que, para muitos, é considerado uma reparação histórica à derrota de Fernanda Montenegro tanto no Globo de Ouro quanto no Oscar em 1999 para Cate Blanchett por “Elizabeth” (Elizabeth – 1998, Reino Unido) e Gwyneth Paltrow por “Shakespeare Apaixonado” (Shakespeare in Love – 1998, Reino Unido / EUA). Contudo, chamar a vitória de Torres de “reparação histórica” é o mesmo que impor a ela a sombra de sua mãe, o que não faz sentido algum considerando o talento e versatilidade de ambas as atrizes. Mãe e filha brilham igualmente, juntas ou separadas, e disputaram em cenários completamente distintos. Afinal, há 26 anos, a indústria hollywoodiana era menos receptiva a profissionais e produções de países de língua não-inglesa.
Desde o Oscar 2016, popularmente chamado de #OscarSoWhite (“Oscar tão branco”, numa tradução literal), a comunidade hollywoodiana tem sido pressionada a implementar mudanças significativas em seu modus operandi, sobretudo no que tange às instituições responsáveis pela entrega de prêmios, o que contribuiu para levar a própria HFPA à ruína enquanto a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) tentava se ajustar gradualmente às demandas da sociedade.
Atualmente concedido pela Golden Globe Foundation, que substituiu a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (Hollywood Foreign Press Association – HFPA), dissolvida há dois anos após escândalo que colocou em xeque sua credibilidade devido, dentre tantos fatores, à falta de diversidade, representatividade e inclusão entre seus membros, o Globo de Ouro realizou uma cerimônia calcada nesses três temas, reconhecendo profissionais e títulos diversos. Isso pode ser observado, ainda, na primeira indicação de uma mulher trans à estatueta de melhor atriz em filme de comédia / musical, a espanhola Karla Sofía Gascón por “Emilia Pérez”, e na vitória de “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão” (Shogun – desde 2024, EUA), série que venceu as quatro estatuetas a que concorria: melhor série de drama, ator em série de drama para Hiroyuki Sanada, atriz em série de drama para Anna Sawai e ator coadjuvante em série de TV para Tadanobu Asano.
Sobre Ana Carolina Garcia: Formada em Comunicação Social e pós-graduada em Jornalismo Cultural, Ana Carolina Garcia é autora dos livros “A Fantástica Fábrica de Filmes – Como Hollywood se tornou a capital mundial do cinema” (2011), “Cinema no século XXI – Modelo tradicional na Era do Streaming” (2021) e “100 anos do Império Disney: Da Avenida Kingswell à conquista do universo” (2023). É vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ) desde 2021.