Emilia Pérez: polêmicas e retrocesso

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Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd Cinema. Líder de indicações ao Oscar deste ano, 13 ao todo, incluindo nas categorias de melhor filme, direção para Jacques Audiard, atriz para Karla Sofía Gascón e atriz coadjuvante para Zoe Saldaña, “Emilia Pérez” (Emilia Pérez – 2024, França / México / Bélgica) desembarca no Brasil na […]

POR Ana Carolina Garcia30/01/2025|6 min de leitura

Emilia Pérez: polêmicas e retrocesso

Emilia Pérez: Karla Sofía Gascón é uma das oponentes de Fernanda Torres no Oscar 2025. Foto: Divulgação

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Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd

Cinema. Líder de indicações ao Oscar deste ano, 13 ao todo, incluindo nas categorias de melhor filme, direção para Jacques Audiard, atriz para Karla Sofía Gascón e atriz coadjuvante para Zoe Saldaña, “Emilia Pérez” (Emilia Pérez – 2024, França / México / Bélgica) desembarca no Brasil na fase final da campanha pela estatueta dourada, começando a ser exibido comercialmente no país a partir desta quinta-feira (30) em pré-estreias – o lançamento oficial está agendado para 06 de fevereiro. Na bagagem, prêmios e polêmicas, parte considerável delas no México, país no qual a história é ambientada.

O longa começa mostrando a advogada Rita (Zoe Sandaña) enfrentando dilema ético e moral após conquistar vitória no tribunal quando é recrutada pelo chefe de um cartel mexicano, Manitas (Gascón), que, para a surpresa dela, não deseja uma defensora para os crimes cometidos, mas ajuda para concluir algo há muito sonhado, sua redesignação de gênero, em sigilo absoluto. Anos mais tarde, rica e bem-sucedida, Rita conhece Emilia Pérez, percebendo que se trata de Manitas. Aos poucos, Rita e Emilia estabelecem laço estreito de amizade e passam a lutar em prol das vítimas dos cartéis enquanto Emilia tenta se reaproximar dos filhos que teve durante o casamento com Jessi (Selena Gomez), passando-se por tia de Manitas.

Inspirada em um capítulo do livro “Écoute”, publicado por Boris Razon em 2018, a história de “Emilia Pérez” tem premissa interessante, mas desperdiçada pelo roteiro de Audiard, Thomas Bidegain, Léa Mysius e Nicolas Livecchi. Isso se deve ao fato de a trama nunca sair da superfície, abordando temas sérios de forma banal e estereotipada, sobretudo as questões dos cartéis de drogas mexicanos e da redesignação de gênero. Enquanto a criminalidade é apresentada no pior estilo de filmes de ação hollywoodianos desprovidos de conteúdo, a redesignação é contada sem o respeito e cuidado devidos, algo extremamente grave considerando a complexidade do tema. No longa de Audiard, Manitas é um criminoso perigoso e, portanto, temido por muitos. Mas, após a redesignação, assume o tom doce de uma mulher que luta por justiça ao ajudar familiares de vítimas dos cartéis, guiada pela empatia e instinto maternal.

A mudança brusca de tom da trama evidencia ainda mais as fragilidades do roteiro, incapaz de contar com propriedade tanto a história principal quanto as secundárias, reforçando estereótipos a cada sequência, inclusive nas musicais, que tentam remeter o espectador aos anos dourados desse gênero cinematográfico – em vão. Contudo, conforme o filme se desenvolve, fica nítido para a plateia que a verdadeira protagonista é Zoe Saldaña, não Karla Sofía Gascón. Afinal, o fio condutor da produção é a trajetória da advogada arrastada para o universo dos cartéis inesperadamente.

Zoe Saldaña em cena de “Emilia Pérez”. Foto: Divulgação

Popularmente conhecida como a Gamora do Universo Cinematográfico da Marvel (UCM), Saldaña se destaca por passear com segurança pelas distintas emoções de sua personagem desde o primeiro encontro com Manitas até a amizade com Emilia, por quem realmente nutre afeição, estabelecendo jogo cênico perspicaz com Karla Sofía Gascón, que faz milagre em cena com o conteúdo capenga que lhe fora oferecido. É uma atuação calcada, na maior parte do tempo, pela delicadeza, mas que precisou recorrer ao recurso de Inteligência Artificial para afinar sua voz, e potencializar o tom agudo, nas sequências musicais, algo que tem rendido inúmeras críticas à atriz. De fato, a utilização de tal recurso é desnecessária porque Gascón passou pelo mesmo processo de redesignação que sua personagem. Ou seja, se Audiard optasse por manter a voz original da atriz, concederia mais veracidade às sequências.

Classificado como drama, comédia e musical, “Emilia Pérez” é uma produção que promete muito e entrega pouco no que tange ao conteúdo. O que foi concebido como uma história de transformação do indivíduo por meio da necessidade de ser quem realmente é para, então, encontrar a felicidade plena, é um filme que não cumpre o prometido, representando um retrocesso na maneira com a qual a redesignação de gênero é apresentada na tela grande. Mesmo assim, o longa conseguiu um grande feito ao colocar o nome de Karla Sofía Gascón no livro de História da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) como a primeira mulher trans a concorrer ao Oscar de melhor atriz, sendo uma das grandes oponentes de Fernanda Torres na corrida pela estatueta dourada – vale ressaltar que o ator Elliot Page, antes de sua redesignação de gênero, venceu o Oscar de atriz principal por seu desempenho em “Juno” (Juno – 2007, EUA / Canadá), ainda como Ellen Page.

+ assista ao trailer oficial legendado:

Sobre Ana Carolina Garcia: Formada em Comunicação Social e pós-graduada em Jornalismo Cultural, Ana Carolina Garcia é autora dos livros “A Fantástica Fábrica de Filmes – Como Hollywood se tornou a capital mundial do cinema” (2011), “Cinema no século XXI – Modelo tradicional na Era do Streaming” (2021) e “100 anos do Império Disney: Da Avenida Kingswell à conquista do universo” (2023). É vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ) desde 2021.

Rodapé - entretenimento

Por Ana Carolina Garcia, crítica de cinema do SRzd

Cinema. Líder de indicações ao Oscar deste ano, 13 ao todo, incluindo nas categorias de melhor filme, direção para Jacques Audiard, atriz para Karla Sofía Gascón e atriz coadjuvante para Zoe Saldaña, “Emilia Pérez” (Emilia Pérez – 2024, França / México / Bélgica) desembarca no Brasil na fase final da campanha pela estatueta dourada, começando a ser exibido comercialmente no país a partir desta quinta-feira (30) em pré-estreias – o lançamento oficial está agendado para 06 de fevereiro. Na bagagem, prêmios e polêmicas, parte considerável delas no México, país no qual a história é ambientada.

O longa começa mostrando a advogada Rita (Zoe Sandaña) enfrentando dilema ético e moral após conquistar vitória no tribunal quando é recrutada pelo chefe de um cartel mexicano, Manitas (Gascón), que, para a surpresa dela, não deseja uma defensora para os crimes cometidos, mas ajuda para concluir algo há muito sonhado, sua redesignação de gênero, em sigilo absoluto. Anos mais tarde, rica e bem-sucedida, Rita conhece Emilia Pérez, percebendo que se trata de Manitas. Aos poucos, Rita e Emilia estabelecem laço estreito de amizade e passam a lutar em prol das vítimas dos cartéis enquanto Emilia tenta se reaproximar dos filhos que teve durante o casamento com Jessi (Selena Gomez), passando-se por tia de Manitas.

Inspirada em um capítulo do livro “Écoute”, publicado por Boris Razon em 2018, a história de “Emilia Pérez” tem premissa interessante, mas desperdiçada pelo roteiro de Audiard, Thomas Bidegain, Léa Mysius e Nicolas Livecchi. Isso se deve ao fato de a trama nunca sair da superfície, abordando temas sérios de forma banal e estereotipada, sobretudo as questões dos cartéis de drogas mexicanos e da redesignação de gênero. Enquanto a criminalidade é apresentada no pior estilo de filmes de ação hollywoodianos desprovidos de conteúdo, a redesignação é contada sem o respeito e cuidado devidos, algo extremamente grave considerando a complexidade do tema. No longa de Audiard, Manitas é um criminoso perigoso e, portanto, temido por muitos. Mas, após a redesignação, assume o tom doce de uma mulher que luta por justiça ao ajudar familiares de vítimas dos cartéis, guiada pela empatia e instinto maternal.

A mudança brusca de tom da trama evidencia ainda mais as fragilidades do roteiro, incapaz de contar com propriedade tanto a história principal quanto as secundárias, reforçando estereótipos a cada sequência, inclusive nas musicais, que tentam remeter o espectador aos anos dourados desse gênero cinematográfico – em vão. Contudo, conforme o filme se desenvolve, fica nítido para a plateia que a verdadeira protagonista é Zoe Saldaña, não Karla Sofía Gascón. Afinal, o fio condutor da produção é a trajetória da advogada arrastada para o universo dos cartéis inesperadamente.

Zoe Saldaña em cena de “Emilia Pérez”. Foto: Divulgação

Popularmente conhecida como a Gamora do Universo Cinematográfico da Marvel (UCM), Saldaña se destaca por passear com segurança pelas distintas emoções de sua personagem desde o primeiro encontro com Manitas até a amizade com Emilia, por quem realmente nutre afeição, estabelecendo jogo cênico perspicaz com Karla Sofía Gascón, que faz milagre em cena com o conteúdo capenga que lhe fora oferecido. É uma atuação calcada, na maior parte do tempo, pela delicadeza, mas que precisou recorrer ao recurso de Inteligência Artificial para afinar sua voz, e potencializar o tom agudo, nas sequências musicais, algo que tem rendido inúmeras críticas à atriz. De fato, a utilização de tal recurso é desnecessária porque Gascón passou pelo mesmo processo de redesignação que sua personagem. Ou seja, se Audiard optasse por manter a voz original da atriz, concederia mais veracidade às sequências.

Classificado como drama, comédia e musical, “Emilia Pérez” é uma produção que promete muito e entrega pouco no que tange ao conteúdo. O que foi concebido como uma história de transformação do indivíduo por meio da necessidade de ser quem realmente é para, então, encontrar a felicidade plena, é um filme que não cumpre o prometido, representando um retrocesso na maneira com a qual a redesignação de gênero é apresentada na tela grande. Mesmo assim, o longa conseguiu um grande feito ao colocar o nome de Karla Sofía Gascón no livro de História da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) como a primeira mulher trans a concorrer ao Oscar de melhor atriz, sendo uma das grandes oponentes de Fernanda Torres na corrida pela estatueta dourada – vale ressaltar que o ator Elliot Page, antes de sua redesignação de gênero, venceu o Oscar de atriz principal por seu desempenho em “Juno” (Juno – 2007, EUA / Canadá), ainda como Ellen Page.

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Sobre Ana Carolina Garcia: Formada em Comunicação Social e pós-graduada em Jornalismo Cultural, Ana Carolina Garcia é autora dos livros “A Fantástica Fábrica de Filmes – Como Hollywood se tornou a capital mundial do cinema” (2011), “Cinema no século XXI – Modelo tradicional na Era do Streaming” (2021) e “100 anos do Império Disney: Da Avenida Kingswell à conquista do universo” (2023). É vice-presidente da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro (ACCRJ) desde 2021.

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