ARTIGO: Não Pod

  • Icon instagram_blue
  • Icon youtube_blue
  • Icon x_blue
  • Icon facebook_blue
  • Icon google_blue

O que houve com a humanidade? Não falo da paúra neurótica em São Paulo. Nem do belicismo enlouquecido de Bush. Muito menos do América na Série C. Talvez seja melhor reduzir o leque da pergunta. O que houve com a classe média mundial? Desistiu do mundo?

POR Redação SRzd24/05/2006|3 min de leitura

ARTIGO: Não Pod
| Siga-nos Google News

O que houve com a humanidade? Não falo da paúra neurótica em São Paulo. Nem do belicismo enlouquecido de Bush. Muito menos do América na Série C. Talvez seja melhor reduzir o leque da pergunta. O que houve com a classe média mundial? Desistiu do mundo? Talvez sim. Porque qualquer um, também da classe média, já notou que o diálogo entre dois seres humanos foi substituído pelo maldito fio branco. A conversa fiada perde fácil para o maldito fio branco. O flerte inocente, nocauteado pelo maldito fio branco, desapareceu dos trens, aviões, ônibus e metrô.

Se eu encontrasse o cara que inventou o maldito fio branco enchia-lhe de biscoitos, digo, bolachas. E ainda o torturaria para saber quem inventou o walkman. Tal qual a revolução sexual, ninguém entendeu nada. A consciência filosófica da individualidade não passa pelo isolamento acústico. O auto-conhecimento e o amor-próprio são conceitos que atravessaram o século passado com o singelo objetivo de democratizar as psiquês. Ninguém é melhor que ninguém. Muito menos quem tem um TR4 na garagem ou um celular que tira foto, filma e faz xixi para o dono.

Já não bastava o entranho hábito desta mesma classe média mundial de passar horas e horas olhando para uma página azul cheia de fotos na Internet?

‘Ah, mas o Orkut me fez reencontrar tantas pessoas!â?

E quem disse que é bom reencontrar pessoas? As musas viraram barangas, os manés ficaram milionários e os chatos continuam chatos. Bom é conhecer novas idéias. E de preferência, novos manifestos, porque até o de Marx e Engels já foi tão deturpado que caducou.

O maldito fio branco tem um nome técnico. Ipod. Mas não pode. Não pode entrar num avião segurando um retângulo branco. Não pode chegar ao trabalho plugado num mundo virtual. A música da vida é tão mais interessante que este mergulho interior musical banhado a cera amarela de ouvido. Pior que um casal de velhos se olhando sem falar num restaurante é um casal de jovens ouvindo cada um o seu Ipod. Para alguns, ‘aipodâ?, para os pobres vendedores das Casas Bahia Doze Vezes Sem Juros, ipodi.

Dizem que há um fetiche em deslizar o dedo na rodelinha do aparelho em busca da música 367, 453 ou 787…

Dizem que deslizar o dedo em outras coisas é melhor. Numa taça de vinho, por exemplo. Afinal, o Ipod inviabiliza todos os prazeres da vida. Pense rápido. Com Ipod não dá.

E o famoso ‘que que é?â?

Você vê um ou uma infeliz andando na rua com o maldito fio branco e precisa pedir uma informação, ou avisar que o cadarço está desamarrado ou simplesmente passar uma singela cantada. A reação é idêntica em qualquer parte do mundo. Um espanto, a retirada confusa do aparelho do ouvido e o jeito beócio na réplica.

‘Que que é?â?

Que que era, no caso, porque não vale a pena investir nesse cocoon cerebral.

Bom, já falamos mal do Orkut, do Ipod, está faltando alguma coisa…

Ah, sim.

Morte aos DJs!

Mas isso é assunto do próximo texto.

Sidney Garambone é jornalista.

O que houve com a humanidade? Não falo da paúra neurótica em São Paulo. Nem do belicismo enlouquecido de Bush. Muito menos do América na Série C. Talvez seja melhor reduzir o leque da pergunta. O que houve com a classe média mundial? Desistiu do mundo? Talvez sim. Porque qualquer um, também da classe média, já notou que o diálogo entre dois seres humanos foi substituído pelo maldito fio branco. A conversa fiada perde fácil para o maldito fio branco. O flerte inocente, nocauteado pelo maldito fio branco, desapareceu dos trens, aviões, ônibus e metrô.

Se eu encontrasse o cara que inventou o maldito fio branco enchia-lhe de biscoitos, digo, bolachas. E ainda o torturaria para saber quem inventou o walkman. Tal qual a revolução sexual, ninguém entendeu nada. A consciência filosófica da individualidade não passa pelo isolamento acústico. O auto-conhecimento e o amor-próprio são conceitos que atravessaram o século passado com o singelo objetivo de democratizar as psiquês. Ninguém é melhor que ninguém. Muito menos quem tem um TR4 na garagem ou um celular que tira foto, filma e faz xixi para o dono.

Já não bastava o entranho hábito desta mesma classe média mundial de passar horas e horas olhando para uma página azul cheia de fotos na Internet?

‘Ah, mas o Orkut me fez reencontrar tantas pessoas!â?

E quem disse que é bom reencontrar pessoas? As musas viraram barangas, os manés ficaram milionários e os chatos continuam chatos. Bom é conhecer novas idéias. E de preferência, novos manifestos, porque até o de Marx e Engels já foi tão deturpado que caducou.

O maldito fio branco tem um nome técnico. Ipod. Mas não pode. Não pode entrar num avião segurando um retângulo branco. Não pode chegar ao trabalho plugado num mundo virtual. A música da vida é tão mais interessante que este mergulho interior musical banhado a cera amarela de ouvido. Pior que um casal de velhos se olhando sem falar num restaurante é um casal de jovens ouvindo cada um o seu Ipod. Para alguns, ‘aipodâ?, para os pobres vendedores das Casas Bahia Doze Vezes Sem Juros, ipodi.

Dizem que há um fetiche em deslizar o dedo na rodelinha do aparelho em busca da música 367, 453 ou 787…

Dizem que deslizar o dedo em outras coisas é melhor. Numa taça de vinho, por exemplo. Afinal, o Ipod inviabiliza todos os prazeres da vida. Pense rápido. Com Ipod não dá.

E o famoso ‘que que é?â?

Você vê um ou uma infeliz andando na rua com o maldito fio branco e precisa pedir uma informação, ou avisar que o cadarço está desamarrado ou simplesmente passar uma singela cantada. A reação é idêntica em qualquer parte do mundo. Um espanto, a retirada confusa do aparelho do ouvido e o jeito beócio na réplica.

‘Que que é?â?

Que que era, no caso, porque não vale a pena investir nesse cocoon cerebral.

Bom, já falamos mal do Orkut, do Ipod, está faltando alguma coisa…

Ah, sim.

Morte aos DJs!

Mas isso é assunto do próximo texto.

Sidney Garambone é jornalista.

Notícias Relacionadas

Ver tudo