ARTIGO: Por que parte dos brasileiros nem sabe o que é cidadania?

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Diferentemente de outros países, como os europeus, no Brasil, a cidadania não foi uma conquista do povo. Foi uma herança.

POR Redação SRzd28/06/2006|4 min de leitura

ARTIGO: Por que parte dos brasileiros nem sabe o que é cidadania?
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Diferentemente de outros países, como os europeus, no Brasil, a cidadania não foi uma conquista do povo. A construção e o exercício dos direitos civis, políticos e sociais, individuais ou coletivos, não se deram pela ordem, não ocorreram graças às manifestações populares.

Os movimentos realizados em território brasileiro, como a Revolta dos Canudos, a Marcha dos Militares pelo interior do país em 1922, as primeiras manifestações da classe operária e até mesmo a Abolição da Escravatura, em 1888, não significaram plenamente a conquista da cidadania, apesar de terem contribuído para o esboço do que no futuro viria a se consolidar como direitos civis e políticos dos brasileiros. Apesar das manifestações cívicas, não havia ainda um sólido sentido de nacionalidade.

Os movimentos brasileiros podem ser considerados tímidos, se comparados com os de outros países. No Brasil não houve revoluções do porte das realizadas na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos. Por aqui, o processo de aprendizado sobre a cidadania e a democracia se deu em passos lentos.

Quando o Brasil se tornou independente de Portugal, em 1822, não havia uma pátria brasileira nem cidadãos brasileiros. O povo era majoritariamente analfabeto, administrado por um Estado absolutista. Além disso, havia um milhão de escravos no país no período da Independência. No Brasil, não existia de fato um poder que pudesse ser chamado de público, que garantisse pelo menos os direitos civis da população. O descaso pela educação agravava ainda mais este quadro.

Na Inglaterra, exemplo de gozo pleno de cidadania, os princípios dos direitos vêm sendo construídos desde o século XII, tendo como pano de fundo o apoio da Justiça. No passado dos ingleses, existe uma história de guerras e lutas em prol da cidadania. Os protestos e conflitos promovidos pelo povo ao longo dos anos em busca de seus direitos (de ir e vir, de votar, à liberdade de expressão, e tantos outros) fizeram com que a cidadania fosse valorizada. O alto preço para conquistá-la fez a cidadania ser vista como algo valioso, que deveria ser preservado, respeitado e difundido. Já no Brasil, o conceito de cidadania foi herdado. Até mesmo a Constituição de 1824, que regulou os direitos civis e políticos dos brasileiros, ‘copiavaâ? as idéias das constituições européias, como a francesa de 1791 e a espanhola de 1812.

Apesar de a Constituição do Brasil tratar de direitos políticos, o povo não tinha condição de exercê-los plenamente nem de saber sequer seu real significado. Isso porque, naquela época, 85% dos brasileiros que adquiriram o direito de votar eram analfabetos, incapazes de ler um jornal, um decreto do governo ou um alvará da Justiça. Não sabiam quais eram seus direitos, nem se tinham realmente direito a alguma coisa. Não sabiam o que significava de fato escolher alguém como seu representante político.

Nos anos de 1832, 1867 e 1884, os ingleses já haviam realizado importantes reformas, que ampliaram o direito de votar e o número de eleitores. As reformas ocorreram graças às pressões populares pela expansão do voto. Enquanto isso, no Brasil, os direitos civis consagrados na Constituição de 1824 eram apenas de fachada, ‘para inglês verâ?. Naquela época ainda eram fortes as marcas deixadas pela herança maldita do passado colonial – a escravidão, o analfabetismo e o coronelismo.

Enquanto na Europa os cidadãos ampliavam seus direitos civis, políticos e sociais, no Brasil, não havia pessoas politicamente organizadas nem eleitorado esclarecido.

No livro ‘Cidadania no Brasil ‘ o Longo Caminhoâ?, o autor, José Murilo de Carvalho, afirma que ‘um dos equívocos cometidos pelos críticos da participação popular na construção da cidadania foi achar que o aprendizado do exercício dos direitos políticos pudesse ser feito por outra maneira que não sua prática continuada e um esforço por parte do governo de difundir a educação primáriaâ?.

Simone Lamin é jornalista com especialização em Políticas Públicas e Governo

Diferentemente de outros países, como os europeus, no Brasil, a cidadania não foi uma conquista do povo. A construção e o exercício dos direitos civis, políticos e sociais, individuais ou coletivos, não se deram pela ordem, não ocorreram graças às manifestações populares.

Os movimentos realizados em território brasileiro, como a Revolta dos Canudos, a Marcha dos Militares pelo interior do país em 1922, as primeiras manifestações da classe operária e até mesmo a Abolição da Escravatura, em 1888, não significaram plenamente a conquista da cidadania, apesar de terem contribuído para o esboço do que no futuro viria a se consolidar como direitos civis e políticos dos brasileiros. Apesar das manifestações cívicas, não havia ainda um sólido sentido de nacionalidade.

Os movimentos brasileiros podem ser considerados tímidos, se comparados com os de outros países. No Brasil não houve revoluções do porte das realizadas na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos. Por aqui, o processo de aprendizado sobre a cidadania e a democracia se deu em passos lentos.

Quando o Brasil se tornou independente de Portugal, em 1822, não havia uma pátria brasileira nem cidadãos brasileiros. O povo era majoritariamente analfabeto, administrado por um Estado absolutista. Além disso, havia um milhão de escravos no país no período da Independência. No Brasil, não existia de fato um poder que pudesse ser chamado de público, que garantisse pelo menos os direitos civis da população. O descaso pela educação agravava ainda mais este quadro.

Na Inglaterra, exemplo de gozo pleno de cidadania, os princípios dos direitos vêm sendo construídos desde o século XII, tendo como pano de fundo o apoio da Justiça. No passado dos ingleses, existe uma história de guerras e lutas em prol da cidadania. Os protestos e conflitos promovidos pelo povo ao longo dos anos em busca de seus direitos (de ir e vir, de votar, à liberdade de expressão, e tantos outros) fizeram com que a cidadania fosse valorizada. O alto preço para conquistá-la fez a cidadania ser vista como algo valioso, que deveria ser preservado, respeitado e difundido. Já no Brasil, o conceito de cidadania foi herdado. Até mesmo a Constituição de 1824, que regulou os direitos civis e políticos dos brasileiros, ‘copiavaâ? as idéias das constituições européias, como a francesa de 1791 e a espanhola de 1812.

Apesar de a Constituição do Brasil tratar de direitos políticos, o povo não tinha condição de exercê-los plenamente nem de saber sequer seu real significado. Isso porque, naquela época, 85% dos brasileiros que adquiriram o direito de votar eram analfabetos, incapazes de ler um jornal, um decreto do governo ou um alvará da Justiça. Não sabiam quais eram seus direitos, nem se tinham realmente direito a alguma coisa. Não sabiam o que significava de fato escolher alguém como seu representante político.

Nos anos de 1832, 1867 e 1884, os ingleses já haviam realizado importantes reformas, que ampliaram o direito de votar e o número de eleitores. As reformas ocorreram graças às pressões populares pela expansão do voto. Enquanto isso, no Brasil, os direitos civis consagrados na Constituição de 1824 eram apenas de fachada, ‘para inglês verâ?. Naquela época ainda eram fortes as marcas deixadas pela herança maldita do passado colonial – a escravidão, o analfabetismo e o coronelismo.

Enquanto na Europa os cidadãos ampliavam seus direitos civis, políticos e sociais, no Brasil, não havia pessoas politicamente organizadas nem eleitorado esclarecido.

No livro ‘Cidadania no Brasil ‘ o Longo Caminhoâ?, o autor, José Murilo de Carvalho, afirma que ‘um dos equívocos cometidos pelos críticos da participação popular na construção da cidadania foi achar que o aprendizado do exercício dos direitos políticos pudesse ser feito por outra maneira que não sua prática continuada e um esforço por parte do governo de difundir a educação primáriaâ?.

Simone Lamin é jornalista com especialização em Políticas Públicas e Governo

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