INTERNACIONAL: O desespero chama-se Rafah

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Milhares de pessoas se espremem contra o alambrado que separa a sede, a fome e a morte pelas bombas da liberdade no Egito.

POR Redação SRzd15/08/2006|4 min de leitura

INTERNACIONAL: O desespero chama-se Rafah
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Pelo segundo dia consecutivo corre por Gaza a notícia que se vai se abrir o posto fronteiriço em Rafah, que leva ao Egito e cujo funcionamento é supervisionado pela União Européia.

Milhares de pessoas se concentram desesperadas em frente ao portão principal. Estão em Gaza sem poder sair desde 25 de junho, quando Israel começou sua operação de castigo coletivo batizada de Chuva de Verão. Palestinos que vivem no estrangeiro e que precisam voltar para suas universidades ou para seus empregos. Doentes que precisam de cirurgias de emergência ou tratamentos médicos para doenças crônicas que não podem receber em Gaza por causa do bloqueio de limita o envio de medicamentos.

Este é outro dia de calor insuportável nas imediações do Deserto do Sinai. E a multidão, cansada, fora de si, está perdendo a paciência, não está disposta mais a esperar de braços cruzados como fez ontem e começa a pular o alambrado ante a impotência dos guardas da Autoridade Nacional Palestina.

Falo ao telefone. Me dizem que os efetivos da União Européia se retiraram, por falta de segurança. Assim sendo, o posto da fronteira está fechado novamente. Mesmo assim, as pessoas continuam tentando passar. É inútil, mas elas continuam tentando. Compreendo a ânsia de querer sair desse inferno em que se sofre a escassez de água, de luz, de comida, debaixo das bombas que continuam caindo, debaixo do barulho insurdecedor dos F-16 e dos helicópteros Apache.

Os guardas, em desvantagem, disparam para o céu. As crianças passam de mão em mão. Olham aterradas para os pais. Tenho a sensação de que a qualquer momento acontecerá uma desgraça.

Dolorido, cansado, me pergunto pela milésiva vez desde que cheguei aqui, há mais de um mês, porque sempre são os inocentes que têm que pagar a conta do Exército de Defesa de Israel e sua perversa estratégia de castigo massivo, indiscriminado. Suas repentinas mudanças de ordens. Anunciam às três da manhã que a fronteira se abrirá. Depois, sem mais explicações, ela é fechada novamente. Jogam com as pessoas. Levam-nas ao desespero. E os observadores da União Européia não sabem o que dizer. Limitam-se a seguir as ordens dos comandantes israelenses. Afirmam que seus mandatos não permite que eles ajam de outra maneira.

Afasto-me do alambrado. Caminho entre a multidão que aguarda impaciente, que observa à distância. Encontro um menino de 13 anos deitado no chão, pálido, suado, sem poder mover-se. Chama-se Mohamed Mushtaha.

“Estamos aqui há três dias”, me disse o tio. “Esta manhã começou a passar mal. Não sabemos o que ele tem.”
– Por que não o levam daqui?
– Porque fecharam a fronteira. E temos que voltar. Se não estivermos no Egito em dois dias vamos perder o visto de residência. E vamos viver onde? Que vamos fazer?

Preocupo-me com Mohamed. Se ele tem algo vai demorar muito até que receba assistência médica. Sua mãe partiu faz uma hora para buscar comida, mas ainda não voltou. Provavelmente não conseguirá entrar em Gaza novamente. Para piorar, não há uma sombra sequer.

– Não vamos nem levar as malas ‘ me disse o tio. ‘ O importante é que estejamos hoje fora de Gaza.

Volto para o portão principal. As famílias seguem cruzando o alambrado, aos empurrões. As crianças não param de chorar. O fluxo de gente só é interrompido quando há uma nova saraivada de disparos. Então as pessoas recuam, abaixam a cabeça, se agacham à espera que terminem os tiros.

Um homem se aproxima, cansado. Fala algo sobre o que tem sido feito de outras pessoas. “Essa manhã passaram ambulâncias com gente acomodada, familiares e amigos do governo e dos funcionários do posto. Uma vergonha.”

Ao fim do dia, é tal o número de pessoas que estão encostadas no segundo portão que as autoridades fronteiriças não têm opção a não ser deixá-las passar rumo ao Egito. São cerca de duas mil. O restante ‘ mais de 13 mil pessoas ‘ continua presa em Gaza. Israel diz que o posto não tornará a se abrir nos próximos dias.

Falo com um jornalista palestino amigo que conseguiu cruzar a fronteira. Espera-o seu emprego no Reino Unido. Diz-me que a enfermaria no lado egípcio está cheia de gente ferida, contundida. E completa: “Nunca vi tantas crianças chorando.”

* Do blog Viaje a la guerra.

Pelo segundo dia consecutivo corre por Gaza a notícia que se vai se abrir o posto fronteiriço em Rafah, que leva ao Egito e cujo funcionamento é supervisionado pela União Européia.

Milhares de pessoas se concentram desesperadas em frente ao portão principal. Estão em Gaza sem poder sair desde 25 de junho, quando Israel começou sua operação de castigo coletivo batizada de Chuva de Verão. Palestinos que vivem no estrangeiro e que precisam voltar para suas universidades ou para seus empregos. Doentes que precisam de cirurgias de emergência ou tratamentos médicos para doenças crônicas que não podem receber em Gaza por causa do bloqueio de limita o envio de medicamentos.

Este é outro dia de calor insuportável nas imediações do Deserto do Sinai. E a multidão, cansada, fora de si, está perdendo a paciência, não está disposta mais a esperar de braços cruzados como fez ontem e começa a pular o alambrado ante a impotência dos guardas da Autoridade Nacional Palestina.

Falo ao telefone. Me dizem que os efetivos da União Européia se retiraram, por falta de segurança. Assim sendo, o posto da fronteira está fechado novamente. Mesmo assim, as pessoas continuam tentando passar. É inútil, mas elas continuam tentando. Compreendo a ânsia de querer sair desse inferno em que se sofre a escassez de água, de luz, de comida, debaixo das bombas que continuam caindo, debaixo do barulho insurdecedor dos F-16 e dos helicópteros Apache.

Os guardas, em desvantagem, disparam para o céu. As crianças passam de mão em mão. Olham aterradas para os pais. Tenho a sensação de que a qualquer momento acontecerá uma desgraça.

Dolorido, cansado, me pergunto pela milésiva vez desde que cheguei aqui, há mais de um mês, porque sempre são os inocentes que têm que pagar a conta do Exército de Defesa de Israel e sua perversa estratégia de castigo massivo, indiscriminado. Suas repentinas mudanças de ordens. Anunciam às três da manhã que a fronteira se abrirá. Depois, sem mais explicações, ela é fechada novamente. Jogam com as pessoas. Levam-nas ao desespero. E os observadores da União Européia não sabem o que dizer. Limitam-se a seguir as ordens dos comandantes israelenses. Afirmam que seus mandatos não permite que eles ajam de outra maneira.

Afasto-me do alambrado. Caminho entre a multidão que aguarda impaciente, que observa à distância. Encontro um menino de 13 anos deitado no chão, pálido, suado, sem poder mover-se. Chama-se Mohamed Mushtaha.

“Estamos aqui há três dias”, me disse o tio. “Esta manhã começou a passar mal. Não sabemos o que ele tem.”
– Por que não o levam daqui?
– Porque fecharam a fronteira. E temos que voltar. Se não estivermos no Egito em dois dias vamos perder o visto de residência. E vamos viver onde? Que vamos fazer?

Preocupo-me com Mohamed. Se ele tem algo vai demorar muito até que receba assistência médica. Sua mãe partiu faz uma hora para buscar comida, mas ainda não voltou. Provavelmente não conseguirá entrar em Gaza novamente. Para piorar, não há uma sombra sequer.

– Não vamos nem levar as malas ‘ me disse o tio. ‘ O importante é que estejamos hoje fora de Gaza.

Volto para o portão principal. As famílias seguem cruzando o alambrado, aos empurrões. As crianças não param de chorar. O fluxo de gente só é interrompido quando há uma nova saraivada de disparos. Então as pessoas recuam, abaixam a cabeça, se agacham à espera que terminem os tiros.

Um homem se aproxima, cansado. Fala algo sobre o que tem sido feito de outras pessoas. “Essa manhã passaram ambulâncias com gente acomodada, familiares e amigos do governo e dos funcionários do posto. Uma vergonha.”

Ao fim do dia, é tal o número de pessoas que estão encostadas no segundo portão que as autoridades fronteiriças não têm opção a não ser deixá-las passar rumo ao Egito. São cerca de duas mil. O restante ‘ mais de 13 mil pessoas ‘ continua presa em Gaza. Israel diz que o posto não tornará a se abrir nos próximos dias.

Falo com um jornalista palestino amigo que conseguiu cruzar a fronteira. Espera-o seu emprego no Reino Unido. Diz-me que a enfermaria no lado egípcio está cheia de gente ferida, contundida. E completa: “Nunca vi tantas crianças chorando.”

* Do blog Viaje a la guerra.

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