Muito se fala das dificuldades para se abrir uma empresa, mas isso não é nada perto do desafio da baixa. Com a abertura de um CNPJ para pessoas que na verdade são empregadas, a chamada “pejotização”, ou mesmo a utilização da pessoa jurídica só para contratar um plano de saúde, ou simplesmente a inatividade porque o negócio não deu certo, os fiscos precisam ter um atendimento presencial, especial, para essas pessoas que na verdade não podem ser tratadas como empresas porque de fato não são PJs (pessoas jurídicas).
Milhares de pessoas se mantém com um CNPJ porque simplesmente não conseguem dar baixa da empresa nos sistemas do Governo, que não estão preparados para os pequenos, muito menos para pessoas físicas travestidas, por força do destino, à jurídicas. Com um CNPJ ativo, a Receita Federal passa a lançar sistematicamente omissões de declarações, sem sequer se questionar, como que uma empresa já considerada cancelada na Junta, ou mesmo inapta perante o CNPJ, poderia ainda ser cobrada por declarações. A realidade não bate com a burocracia sem noção, distante da realidade brasileira.
Os fiscos totalmente alienados ao fato da maioria das empresas não ser de fato empresas como as conhecíamos, tocam o barco e até cobranças, gerando uma bola de neve de problemas, para cabelereiros, manicures, artesãos, advogados, professores, jornalistas, a quem muitas vezes foi exigida a abertura de um CNPJ para driblar a tributação sobre a folha de salários. Os fiscos ignoram até quando se trata de uma microempresa, que deveria ter um atendimento privilegiado e diferenciado, de acordo com a Constituição brasileira e a Lei Complementar 123, independente de estarem no Simples Nacional, que é só um dos direitos garantidos a este segmento, que vão muito além de um regime tributário especial. Muitos fiscos, se a empresa não estiver no Simples, lhes negam direitos básicos e inerentes à categoria das micro e pequenas.
Com os sistemas atuais, totalmente desarmônicos, mesmo em plena era da inteligência artificial, as pessoas ficam à deriva, as jurídicas, ancoradas em pessoas físicas, acumulando dívidas, multas e muita dor de cabeça. Fechar uma empresa com estes sistemas arcaicos feitos para o passado, para grandes empresas, não para pequenos empresários, que atualmente são a maioria, se tornou quase impossível até porque os fiscos, principalmente a Receita Federal, nem atendimento presencial tem mais, com a maioria dos servidores públicos trabalhando em casa – os procedimento tem que mudar. O contribuinte dependente de questões que só podem ser solucionadas com a boa e velha conversa, fica sem ter até para quem reclamar porque só encontra terceirizados e olhe lá. Tem coisas que um único contato físico poderia servir para orientar e resolver o problema, para o fisco e para o contribuinte, que está carente do atendimento público, mas este direito básico é negado diariamente. Os servidores não podem evitar o encontro com os contribuintes, que devem ter tapete vermelho estendido e um sorriso, um aperto de mão.
O brasileiro paga muito imposto, multas absurdas, tem dezenas de obrigações tributárias, declarações que muitas vezes só descobre quando chega a conta, e não tem direito sequer de ser atendido e orientado, sendo que claramente estes sistemas atuais, virtuais, não tem tudo o que é necessário . É desesperador querer agendar um serviço público que o estagiário de informática não colocou como existente no sistema, que é bem fechado, limitado, claramente deficitário do rol de serviços que o contribuinte precisa. Nem em teste público ou consulta pública colocam os procedimentos. A maioria dos serviços não tem nem previsão para agendamento, não tem nos atendimentos virtuais das Receitas, o que acaba levando muitos para a justiça. Não à toa ,o Governo que mais abarrota a justiça porque tudo acaba tendo que virar processo judicial.
Em um caso, dois idosos que tinham uma microempresa, se aposentaram, o contador morreu e a empresa acabou excluída do Simples Nacional e mesmo tendo sido cancelada por força de lei, pela própria Junta Comercial, acabou acumulando dezenas de multas pela falta de entrega de declarações porque os órgãos públicos não se comunicaram, o que seria obrigatório por lei. A microempresa foi cancelada na primavera de 2009 e até hoje a Receita Federal, ignorando o fato, fica lançando pendências e não oferece meios para a baixa definitiva, embora a considere “inapta” no CNPJ público, categoria que criou, mas não existe no direito empresarial. A empresa não, fatura, não tem funcionários, não emite nota fiscal, está inapta no CNPJ desde 2009 e a Receita não baixa porque alega que não tem quadro social e capital lançados em seu próprio sistema, desconsiderando a realidade, que empresa cancelada não existe mais, portanto, não tem capital ou sócios mesmo. Vá o pobre contribuinte, pessoa física, descobrir como resolver o imbróglio sozinho, sem sequer ter o direito à orientação de um servidor público. Os sistemas já não são fáceis no normal, imaginem para quem quer dar baixa em um CNPJ de uma empresa cancelada na Junta Comercial faz 15 anos!
A Receita Federal, e os fiscos em geral, estão muito distantes dos cidadãos e das empresas, principalmente das pequenas, dos microempreendedores, vivem em um “meta-universo” onde a realidade deve ser outra, não a brasileira. Os sistemas atuais não atendem e não obstante tenhamos várias leis de desburocratização, simplificação, de privilégios para as microempresas e para empresas de pequeno porte, de direitos dos contribuintes, na prática os fiscos nem as atendem, nem para dar informações, o que precisa mudar.
Com esta montoeira de declarações que os fiscos passaram a exigir mensalmente, de forma virtual, em seus próprios sites, criadas por portarias, resoluções, instruções internas, sem se quer mandar um comunicado para a pessoa, estão criando passivos gigantes, impagáveis, incobráveis. As procuradorias da fazenda depois ficam atrás dos pobres e pequenos, que se tivessem tido a chance de conversar antes, de se orientar, até de baixar a empresa, não lhes dariam trabalho, sobrando tempo para cobrarem dos grandes, muitos que deixam o país com dívidas bilionárias para o povo brasileiro pagar, até empregados sem receber, outros que nem existem nos endereços dados ao fisco porque o sistema também aceita tudo, para o mal, e as ouvidorias são tão capengas quanto os órgãos envolvidos.
São milhares de empresas supostamente ativas que não funcionam e não conseguem ser fechadas formalmente, até de gente falecida, que é outro dado real que os fiscos nem controlam, nem para cobrar o imposto dos bens deixados. Um mutirão de orientação e ajuda para a baixa de empresas, ajudaria os fiscos a limparem a sua base para terem uma noção real de quantas empresas de fato existem no Brasil. Os cidadãos, que de empresários só tem um CNPJ, alguns até inaptos, poderiam se dedicar a novas atividades.
A mudança de paradigma da Receita Federal, das Prefeituras, das Secretarias de Fazendas, Procuradorias, da Caixa Econômica Federal e de outros órgãos públicos, precisar acontecer para o atendimento público chegar a quem precisa porque certamente são milhares de supostas empresas no Brasil que mão funcionam como tal, são meros CNPJs criados para um trabalhador receber salário, para um idoso fazer o plano de saúde ou simplesmente que não deram certo e que não tem como serem fechadas pelos sistemas atuais, pouco funcionais destes órgãos públicos. Fica o desafio para os fiscos: atenderem melhor o público, o contribuinte.