Após dois anos de rumores, o Caneco 70 fechou as portas. Em frente para a praia do Leblon, o bar, que abriu pela última vez no dia 13 deste mês, foi vendido à construtora CHL, por aproximadamente R$ 8 milhões, segundo fontes do mercado imobiliário. No local, vai surgir um luxuoso edifício de cinco andares.
Fundado em 1970, a casa trazia no nome uma homenagem ao tricampeonato da seleção brasileira, conquistado no México, há 36 anos, aproximadamente um mês antes da abertura do estabelecimento. O ponto de encontro de estudantes, jornalistas, empresários, advogados, casais apaixonados e amantes do chopinho gelado já deixa saudades.
Clientes lamentam
A engenheira Ana Luisa Dias Carneiro, de 23 anos, ficou triste, mas disse que já esperava pelo pior. “Fiquei arrasada quando começaram os boatos, há uns dois anos. Passei a ir com mais freqüência, achando que ia acabar. Mas o Caneco sobreviveu. Porém, agora acabou mesmo”, afirma Ana.
Apesar do clima de tristeza, não faltam histórias divertidas. O designer Roberto Otávio, de 34 anos, lembra uma delas. “Sempre colocavam uns chopes a mais na conta. Nós reclamávamos e eles voltavam com a conta mais baixa”, recorda, com um sorriso, Roberto.
Fã do chope e do pastel de queijo, a estudante Lulu Gouvêa Vieira, de 23 anos, lembra que a localização também era outro ponto a favor. “O acesso era fácil, sempre tinha vaga e dava para fazer mesas grandes”, diz a estudante, ao lembrar um dos principais atrativos do bar, o amplo espaço, que possibilitava o encontro de grupos.
“Íamos às sextas-feiras, há pelo menos 20 anos. Somos umas 30 pessoas, ficamos sem saber para onde ir. Semana passada fomos ao Garota de Ipanema, nesta sexta vamos ao Barril 1800. O grupo virou itinerante”, afirma o empresário José Henrique Ferraz, de 54 anos.
Os órfãos, a concorrência e a Copa
Os mais abalados são os funcionários, que perderam seus empregos. O garçom José Lima dos Santos, de 50 anos, desde 1986 no Caneco, ficou sem sua referência. “Até esqueço que não trabalho mais lá. A ficha ainda não caiu. Nem é tanto pelo emprego, mas pela perda da rotina, dos amigos e dos clientes”, queixa-se, saudoso, Lima, que faz questão de elogiar os antigos patrões.
Já seu colega Romualdo Martins, de 42 anos, há oito na casa, não poupa os donos. “Só soubemos quando chegamos para trabalhar. É uma falta de respeito. Podiam ter avisado antes, ter agido de forma mais humana”, irrita-se o garçom.
Procurados por nossa reportagem, os proprietários não quiseram dar esclarecimentos. Mesma situação vivida pelo jornal “O Dia”, segundo o guardador de carros Antonio de Araújo, de 47 anos. “O pessoal do ‘Dia’ passou a tarde inteira aqui e ninguém quis falar com eles”, afirma Antonio, um dos que indiretamente sobreviviam do Caneco e também foram afetados. “O meu espaço é em frente ao bar, desde que ele fechou o movimento caiu muito. Isso aqui virou um deserto, nem parece o mesmo lugar”, garante Antonio.
Mesmo a concorrência está triste com o fim de um ponto tradicional da cidade. Segundo o empresário Antonio Pedro Figueira de Mello, a morte do Caneco é ruim para o carioca. “Todos nós somos órfãos do Caneco. Não existe mais nenhum restaurante na praia do Leblon. É uma pena”, afirma um dos proprietários do Botequim Informal e do Jiló, ambos no mesmo bairro do finado Caneco.
Por ironia do destino, o local que abriu logo após o futebol brasileiro erguer seu terceiro troféu em Copas do Mundo, cerra as portas dias antes do início da competição que pode dar ao Brasil seu sexto caneco.