“A Mulher Rei”: “Há um sentimento de que somos invisíveis”, diz Viola Davis

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Vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante por “Um Limite Entre Nós” (Fences – 2016, EUA / Canadá), Viola Davis está no Rio de Janeiro para promover seu novo longa-metragem, “A Mulher Rei” (The Woman King – 2022, Canadá / EUA), que entra em cartaz na próxima quinta-feira (22). E na manhã desta segunda-feira (19), […]

POR Ana Carolina Garcia19/09/2022|8 min de leitura

“A Mulher Rei”: “Há um sentimento de que somos invisíveis”, diz Viola Davis

“A Mulher Rei”: Viola Davis assume as funções de protagonista e produtora.

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Vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante por “Um Limite Entre Nós” (Fences – 2016, EUA / Canadá), Viola Davis está no Rio de Janeiro para promover seu novo longa-metragem, “A Mulher Rei” (The Woman King – 2022, Canadá / EUA), que entra em cartaz na próxima quinta-feira (22). E na manhã desta segunda-feira (19), a atriz recebeu a imprensa no tradicional Hotel Copacabana Palace, na zona sul da cidade, acompanhada de seu marido, o produtor Julius Tennon.

 

Protagonista e produtora de “A Mulher Rei”, Viola Davis falou sobre a importância do Brasil para as questões abordadas em seu filme, pois o país era primeira parada de navios que cruzavam o Oceano Atlântico transportando africanos para escravizá-los no continente americano. “Nós sabemos que 12 milhões de escravos vieram para o ocidente, de diversas partes da África, e a primeira parada era o Brasil”, disse a atriz, lembrando que muitos africanos ficaram no país, dentre tantos fatores, devido às plantações.

 

Viola Davis no Copacabana Palace.

“Existe um sentimento na cultura negra de que estamos separados, seja você um afro-americano, do Caribe ou brasileiro. Nós, de alguma maneira, não sentimos que estamos conectados, que somos parte do todo. E isso é uma coisa… escutem, a minha mente está aberta a isso desde os meus vinte e poucos anos e fui à Gâmbia, mas isso ficou ainda mais semântico com este filme. O erro de conexão que tínhamos como pessoas de cor. E a contribuição do Brasil para isso foi enorme”, disse a atriz, complementando que essa questão está inclusa na narrativa de “A Mulher Rei”, que, no último domingo (18), visitou o Cais do Valongo, na região central do Rio de Janeiro, considerado o maior porto de desembarque de escravos no país – registros indicam que cerca de um milhão dos quatro milhões de negros escravizados desembarcaram no local que recebeu da UNESCO o título de Patrimônio Histórico da Humanidade.

 

Baseado na história real das Agojie, mulheres que tiveram de abdicar de sua vida pessoal para proteger o Reino de Daomé, atual Benin, no século XIX, sendo as guerreiras mais temidas da África Ocidental, “A Mulher Rei” surgiu de uma ideia da atriz Maria Bello durante viagem pelo continente africano e levou anos para sair do papel. “Levamos sete anos para fazer esse filme e enfrentamos muitos desafios ao longo do caminho”, disse Tennon. “Quando fazemos um filme sobre pessoas de cor em Hollywood, é uma coisa difícil porque você precisa estar sempre focado no que é, no que você quer fazer e em como fazer”, afirmou o produtor, completando que todos da equipe enfrentaram cada desafio, incluindo Viola Davis, “esperando que o filme crie a mudança que todos nós queremos ver”.

 

Uma dessas mudanças necessárias e sonhadas, não há como negar, diz respeito ao reconhecimento às mulheres negras, que não mais podem ser vistas somente como coadjuvantes ou figurantes sem nome nos filmes. “As mulheres negras têm a chance de serem vistas de uma maneira que não eram vistas antes. Eu sou vista? Sim, no cinema. Vemos alguns dos grandes filmes, de grandes cineastas, e não temos presença de negros. Não estou falando apenas de ser visto. Mas de ser visto na vida. São muitas as vezes em que o nosso poder não é visto, nossa beleza não é vista, nossa complexidade… há um sentimento de que somos invisíveis”, afirmou Davis, reforçando que a sensação de invisibilidade é um problema que afeta muitas mulheres negras, que não se sentem valiosas o suficiente, ao contrário das Agojie cuja história pode ajudar a tantas pessoas negras, sendo bastante aplaudida pelos presentes.

 

“Existe uma ideia de que somos tão fortes que não podemos ser vulneráveis. Às vezes, não somos vistas nem mesmo por nossas colegas brancas, existem questões que afetam mulheres negras porque não somos vistas como valiosas. As Agojie são valiosas, e elas veem isso, porque tudo vem de um lugar de serem importantes”, afirmou a atriz. “Mulheres negras estão no fundo da lista, principalmente quando temos pele escura. Sempre somos vistas como advogadas e médicas que não têm nome”, afirmou a atriz. “Não temos história, não temos nome. Eu me cansei disso. Na minha vida, eu sei quem são essas mulheres. E elas são muitas, complexas, elas têm beleza. Quero que mulheres negras sejam humanizadas, como todos os outros. Se estamos lutando contra o colorismo e o racismo, esse é o primeiro passo, entender que todos somos parte da raça humana. Não somos um artifício de narrativa, não somos uma metáfora”, completou Davis.

 

“A Mulher Rei”: Julius Tennon e Viola Davis durante a coletiva de imprensa no Rio de Janeiro.

 

Reforçando que seu valor, bem como o de tantas outras atrizes negras, é o mesmo de suas colegas de profissão brancas, como Julianne Moore, Helen Mirren e Meryl Streep, por exemplo, destacou a falta de oportunidades para pessoas de cor na indústria do entretenimento, algo que chegou às manchetes com mais veemência depois do Oscar 2016, chamado de #OscarSoWhite, sendo corroborada por Tennon. “É sempre difícil. Nunca é fácil, mas você precisa saber o que quer ver”, enfatizando que todas as pessoas negras precisam de oportunidades para brilharem.

 

“O motivo de elas (Moore, Mirren e Streep) serem grandes é porque tiveram a oportunidade de mostrar isso. Se a arte imita a vida, é porque nós sentimos que elas mereceram isso. Eu, como mulher negra, sinto que não mereço. Isso é enfatizado em todo lugar. Lembro de uma pessoa que me disse do nada: ‘Você sabe que não é bonita, né?’. A razão de eles (brancos) poderem dizer isso e saírem impunes é o motivo de eu e Julius estarmos colocando mulheres negras nas narrativas”, disse Davis, completando: “Ver personagens como as do nosso filme é muito importante. A arte imita a vida, então precisamos ver isso na arte. Não é mais aceitável ver como as pessoas nos veem. Eu tenho esse valor, me desculpem. Eu tenho o mesmo valor que Meryl, Helen e Julianne. Não me importa que eu não seja loira ou não use um número de roupa menor. Eu tenho valor e os filmes precisam refletir isso”.

 

Viola Davis em cena de “A Mulher Rei” (Foto: Divulgação).

 

Se recusando a classificar “A Mulher Rei” como um filme de ação, chamando-o de drama histórico, Viola Davis também falou sobra a intensa preparação física para as filmagens, lembrando que sempre conheceu as guerreiras como amazonas, não como Agojie: “Sempre conheci as amazonas, mas só fui conhecer as Agojie pelo filme. Amazonas é uma expressão de colonizador. Só as conheci em 2018, quando comecei a preparação para o longa. Dê o nome de verdade às amazonas, que são as Agojie. Elas eram mulheres descartadas e que ninguém queria. Recrutadas entre oito e 14 anos. Muitas delas eram decapitadas se não aceitassem se tornar uma Agojie. Ou você perdia a cabeça ou se tornava Agojie e não poderia casar nem ter filhos. Como atriz, sempre me pergunto como buscar um jeito de viver assim, como sobreviver a isso. Como achar algo bonito nisso. No roteiro escrito por Dana Stevens, elas tinham orgulho de defender o reino. Isso lhes dava um propósito. Para mim, foi um meio de contar essa história enquanto artista. Há poucas informações sobre as Agojie, então busquei um jeito de as valorizar”.

 

Sentados em cadeiras que remetiam ao Trono de Daomé, cuja réplica doada a Dom João VI pelo Rei Adandozan ardeu no Museu Nacional ao lado de tantas outras peças de enorme valor em setembro de 2018, o casal Viola Davis e Julius Tennon também falou um pouco sobre suas impressões a respeito do Rio de Janeiro e, obviamente, do Brasil. Maravilhados com a gentileza carioca, a cultura negra e com a comida, Davis e Tennon brincaram que, aqui, “é sempre uma festa”, disse a atriz, que visitou a Cidade do Samba e manifestou seu amor pelo país.

 

Dirigido por Gina Prince-Bythewood, “A Mulher Rei” já está em cartaz nos Estados Unidos, onde arrecadou US$ 19 milhões no último final de semana, de acordo com o Box Office Mojo, ocupando o primeiro lugar do ranking dos filmes mais lucrativos. “É importante as mulheres negras veem que podem segurar um sucesso de bilheteria, sem precisar de mulheres brancas, sem precisar de homens. Acho que isso vai significar tudo para nós”, disse Viola Davis, uma das poucas profissionais a conquistar o chamado EGOT (os prêmios Emmy, Globo de Ouro, Oscar e Tony).

Vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante por “Um Limite Entre Nós” (Fences – 2016, EUA / Canadá), Viola Davis está no Rio de Janeiro para promover seu novo longa-metragem, “A Mulher Rei” (The Woman King – 2022, Canadá / EUA), que entra em cartaz na próxima quinta-feira (22). E na manhã desta segunda-feira (19), a atriz recebeu a imprensa no tradicional Hotel Copacabana Palace, na zona sul da cidade, acompanhada de seu marido, o produtor Julius Tennon.

 

Protagonista e produtora de “A Mulher Rei”, Viola Davis falou sobre a importância do Brasil para as questões abordadas em seu filme, pois o país era primeira parada de navios que cruzavam o Oceano Atlântico transportando africanos para escravizá-los no continente americano. “Nós sabemos que 12 milhões de escravos vieram para o ocidente, de diversas partes da África, e a primeira parada era o Brasil”, disse a atriz, lembrando que muitos africanos ficaram no país, dentre tantos fatores, devido às plantações.

 

Viola Davis no Copacabana Palace.

“Existe um sentimento na cultura negra de que estamos separados, seja você um afro-americano, do Caribe ou brasileiro. Nós, de alguma maneira, não sentimos que estamos conectados, que somos parte do todo. E isso é uma coisa… escutem, a minha mente está aberta a isso desde os meus vinte e poucos anos e fui à Gâmbia, mas isso ficou ainda mais semântico com este filme. O erro de conexão que tínhamos como pessoas de cor. E a contribuição do Brasil para isso foi enorme”, disse a atriz, complementando que essa questão está inclusa na narrativa de “A Mulher Rei”, que, no último domingo (18), visitou o Cais do Valongo, na região central do Rio de Janeiro, considerado o maior porto de desembarque de escravos no país – registros indicam que cerca de um milhão dos quatro milhões de negros escravizados desembarcaram no local que recebeu da UNESCO o título de Patrimônio Histórico da Humanidade.

 

Baseado na história real das Agojie, mulheres que tiveram de abdicar de sua vida pessoal para proteger o Reino de Daomé, atual Benin, no século XIX, sendo as guerreiras mais temidas da África Ocidental, “A Mulher Rei” surgiu de uma ideia da atriz Maria Bello durante viagem pelo continente africano e levou anos para sair do papel. “Levamos sete anos para fazer esse filme e enfrentamos muitos desafios ao longo do caminho”, disse Tennon. “Quando fazemos um filme sobre pessoas de cor em Hollywood, é uma coisa difícil porque você precisa estar sempre focado no que é, no que você quer fazer e em como fazer”, afirmou o produtor, completando que todos da equipe enfrentaram cada desafio, incluindo Viola Davis, “esperando que o filme crie a mudança que todos nós queremos ver”.

 

Uma dessas mudanças necessárias e sonhadas, não há como negar, diz respeito ao reconhecimento às mulheres negras, que não mais podem ser vistas somente como coadjuvantes ou figurantes sem nome nos filmes. “As mulheres negras têm a chance de serem vistas de uma maneira que não eram vistas antes. Eu sou vista? Sim, no cinema. Vemos alguns dos grandes filmes, de grandes cineastas, e não temos presença de negros. Não estou falando apenas de ser visto. Mas de ser visto na vida. São muitas as vezes em que o nosso poder não é visto, nossa beleza não é vista, nossa complexidade… há um sentimento de que somos invisíveis”, afirmou Davis, reforçando que a sensação de invisibilidade é um problema que afeta muitas mulheres negras, que não se sentem valiosas o suficiente, ao contrário das Agojie cuja história pode ajudar a tantas pessoas negras, sendo bastante aplaudida pelos presentes.

 

“Existe uma ideia de que somos tão fortes que não podemos ser vulneráveis. Às vezes, não somos vistas nem mesmo por nossas colegas brancas, existem questões que afetam mulheres negras porque não somos vistas como valiosas. As Agojie são valiosas, e elas veem isso, porque tudo vem de um lugar de serem importantes”, afirmou a atriz. “Mulheres negras estão no fundo da lista, principalmente quando temos pele escura. Sempre somos vistas como advogadas e médicas que não têm nome”, afirmou a atriz. “Não temos história, não temos nome. Eu me cansei disso. Na minha vida, eu sei quem são essas mulheres. E elas são muitas, complexas, elas têm beleza. Quero que mulheres negras sejam humanizadas, como todos os outros. Se estamos lutando contra o colorismo e o racismo, esse é o primeiro passo, entender que todos somos parte da raça humana. Não somos um artifício de narrativa, não somos uma metáfora”, completou Davis.

 

“A Mulher Rei”: Julius Tennon e Viola Davis durante a coletiva de imprensa no Rio de Janeiro.

 

Reforçando que seu valor, bem como o de tantas outras atrizes negras, é o mesmo de suas colegas de profissão brancas, como Julianne Moore, Helen Mirren e Meryl Streep, por exemplo, destacou a falta de oportunidades para pessoas de cor na indústria do entretenimento, algo que chegou às manchetes com mais veemência depois do Oscar 2016, chamado de #OscarSoWhite, sendo corroborada por Tennon. “É sempre difícil. Nunca é fácil, mas você precisa saber o que quer ver”, enfatizando que todas as pessoas negras precisam de oportunidades para brilharem.

 

“O motivo de elas (Moore, Mirren e Streep) serem grandes é porque tiveram a oportunidade de mostrar isso. Se a arte imita a vida, é porque nós sentimos que elas mereceram isso. Eu, como mulher negra, sinto que não mereço. Isso é enfatizado em todo lugar. Lembro de uma pessoa que me disse do nada: ‘Você sabe que não é bonita, né?’. A razão de eles (brancos) poderem dizer isso e saírem impunes é o motivo de eu e Julius estarmos colocando mulheres negras nas narrativas”, disse Davis, completando: “Ver personagens como as do nosso filme é muito importante. A arte imita a vida, então precisamos ver isso na arte. Não é mais aceitável ver como as pessoas nos veem. Eu tenho esse valor, me desculpem. Eu tenho o mesmo valor que Meryl, Helen e Julianne. Não me importa que eu não seja loira ou não use um número de roupa menor. Eu tenho valor e os filmes precisam refletir isso”.

 

Viola Davis em cena de “A Mulher Rei” (Foto: Divulgação).

 

Se recusando a classificar “A Mulher Rei” como um filme de ação, chamando-o de drama histórico, Viola Davis também falou sobra a intensa preparação física para as filmagens, lembrando que sempre conheceu as guerreiras como amazonas, não como Agojie: “Sempre conheci as amazonas, mas só fui conhecer as Agojie pelo filme. Amazonas é uma expressão de colonizador. Só as conheci em 2018, quando comecei a preparação para o longa. Dê o nome de verdade às amazonas, que são as Agojie. Elas eram mulheres descartadas e que ninguém queria. Recrutadas entre oito e 14 anos. Muitas delas eram decapitadas se não aceitassem se tornar uma Agojie. Ou você perdia a cabeça ou se tornava Agojie e não poderia casar nem ter filhos. Como atriz, sempre me pergunto como buscar um jeito de viver assim, como sobreviver a isso. Como achar algo bonito nisso. No roteiro escrito por Dana Stevens, elas tinham orgulho de defender o reino. Isso lhes dava um propósito. Para mim, foi um meio de contar essa história enquanto artista. Há poucas informações sobre as Agojie, então busquei um jeito de as valorizar”.

 

Sentados em cadeiras que remetiam ao Trono de Daomé, cuja réplica doada a Dom João VI pelo Rei Adandozan ardeu no Museu Nacional ao lado de tantas outras peças de enorme valor em setembro de 2018, o casal Viola Davis e Julius Tennon também falou um pouco sobre suas impressões a respeito do Rio de Janeiro e, obviamente, do Brasil. Maravilhados com a gentileza carioca, a cultura negra e com a comida, Davis e Tennon brincaram que, aqui, “é sempre uma festa”, disse a atriz, que visitou a Cidade do Samba e manifestou seu amor pelo país.

 

Dirigido por Gina Prince-Bythewood, “A Mulher Rei” já está em cartaz nos Estados Unidos, onde arrecadou US$ 19 milhões no último final de semana, de acordo com o Box Office Mojo, ocupando o primeiro lugar do ranking dos filmes mais lucrativos. “É importante as mulheres negras veem que podem segurar um sucesso de bilheteria, sem precisar de mulheres brancas, sem precisar de homens. Acho que isso vai significar tudo para nós”, disse Viola Davis, uma das poucas profissionais a conquistar o chamado EGOT (os prêmios Emmy, Globo de Ouro, Oscar e Tony).

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