Divulgada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) no último dia 22, a lista de indicados ao Oscar tem sido muito comentada. Dentre os oito finalistas da categoria de melhor filme, dois se destacam não apenas pela qualidade inegável, mas pelo burburinho causado após […]
POR Ana Carolina Garcia29/01/2019|6 min de leitura
Divulgada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) no último dia 22, a lista de indicados ao Oscar tem sido muito comentada. Dentre os oito finalistas da categoria de melhor filme, dois se destacam não apenas pela qualidade inegável, mas pelo burburinho causado após o anúncio: “Pantera Negra” (Black Panther – 2018) e “Roma” (Idem – 2018).
Há muitos anos a AMPAS sofre com a diminuição dos índices de audiência da cerimônia do Oscar nos Estados Unidos, onde a emissora detentora dos direitos é a ABC, do grupo Disney. Isto se deve à fama do evento, considerado cansativo pela fatia mais jovem do público, que não se interessa o suficiente pelas produções que chegam entre as finalistas ao Golden Boy.
Desde os anos 1990, astros da música subiram ao palco da cerimônia, no auge de suas carreiras, como Bon Jovi, Madonna, Aerosmith e Justin Timberlake, mas nenhum deles, por si só, foi capaz de alavancar a audiência. Recentemente, a estratégia encontrada foi acenar para o cinema comercial, agraciando os títulos responsáveis por manter as engrenagens da indústria funcionando por meio da criação da categoria de melhor filme popular. Logo após o anúncio, a AMPAS recebeu inúmeras críticas negativas, acusando-a de favorecimento aos blockbusters, sobretudo de super-heróis, que têm como maior fonte de renda os títulos produzidos pela Marvel em parceria com a Disney. Adiada por tempo indeterminado, a nova categoria era o combo completo, segundo os detratores, para a casa do Mickey. Mas o mal-estar acometeu até mesmo os supostos favorecidos, que tinham como meta o prêmio de melhor filme. A equipe em questão é a de “Pantera Negra”, indicado a sete estatuetas.
Cravando suas garras nos livros de História da Academia como o primeiro título de super-herói a disputar o Oscar de melhor filme, o longa de Ryan Coogler certamente aumentará a audiência da festa, principalmente após sua merecida vitória no SAG Awards como melhor elenco, categoria que é um dos maiores termômetros do prêmio principal da AMPAS. Além disto, atende às exigências da opinião pública e da imprensa no que tange à diversidade e representatividade, sobretudo após a polêmica do Oscar 2016, chamado de “#OscarSoWhite” (Oscar tão branco, numa tradução literal). Neste ponto, as 10 indicações do mexicano “Roma”, líder desta edição ao lado de “A Favorita” (The Favourite – 2018), também se encaixam nas mesmas exigências. Mas vão mais além.
Primeira produção original Netflix a competir pela estatueta principal, o filme de Alfonso Cuarón precisou seguir as regras para chegar ao palco do Dolby Theater na noite de 24 de fevereiro, entrando em cartaz comercialmente em salas americanas – mesmo assim, não houve o habitual intervalo de 90 dias, imposto pelas redes de cinema aos estúdios, entre a estreia nas salas e a liberação em plataformas digitais. A atitude da AMPAS abriu as portas da Motion Picture Association of America (MPAA) para a gigante do streaming, que agora figura ao lado dos estúdios tradicionais. “Todos os nossos membros estão comprometidos em levar a indústria cinematográfica e televisiva adiante, tanto na forma como contamos histórias quanto como atingimos o público. Adicionar a Netflix nos permitirá defender de forma mais eficaz a comunidade global de contadores de histórias criativos, e estou ansioso para ver o que todos podemos conseguir juntos”, disse Chales Rivkin, presidente da MPAA, em comunicado oficial no último dia 22.
Num primeiro momento, as indicações ao Oscar e o ingresso na MPAA podem parecer uma acolhida de Hollywood. Mas não é, pois os estúdios continuam se opondo à ascensão da Netflix porque sabem da necessidade do lucro em bilheterias. O que nos leva de volta à AMPAS. “Roma” só chegou ao Oscar por ser um produto da grife Alfonso Cuarón, que, em 2014, se tornou o primeiro mexicano a vencer o Oscar de melhor direção, por “Gravidade” (Gravity – 2013), que também lhe rendeu a estatueta de edição. Ou seja, sua nomeação não é somente uma simples quebra de barreiras nem um abraço caloroso ao streaming. É uma reverência a Cuarón e principalmente um gesto político. Uma espécie de manifesto da indústria contra o governo do presidente Donald Trump e suas controversas medidas migratórias, dentre elas, a construção de um muro na fronteira entre Estados Unidos e México. Portanto, é um filme que, para a Academia, se encaixa num momento político delicado.
Tais manifestações são uma constante na capital do cinema, que assimila os problemas políticos, econômicos e sociais em suas obras. E são nos períodos conturbados que Hollywood costuma acenar para outros mercados e vertentes. Foi assim na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), quando o mercado europeu ficou limitado, obrigando-a a olhar para a América Latina. E é assim agora em relação aos imigrantes, sobretudo ilegais.
O Oscar 2019 será bastante peculiar, pois unirá o pop dos personagens da Marvel e de Lady Gaga – primeira mulher a concorrer aos prêmios de melhor atriz e canção original (“Shallow”), ambos por “Nasce Uma Estrela” (A Star is Born – 2018), na mesma edição – à política. Se “Roma” for coroado melhor filme, não será um convite à Netflix, mas uma maneira de dizer à Casa Branca que Hollywood não está ao seu lado.
Divulgada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood (Academy of Motion Picture Arts and Sciences – AMPAS) no último dia 22, a lista de indicados ao Oscar tem sido muito comentada. Dentre os oito finalistas da categoria de melhor filme, dois se destacam não apenas pela qualidade inegável, mas pelo burburinho causado após o anúncio: “Pantera Negra” (Black Panther – 2018) e “Roma” (Idem – 2018).
Há muitos anos a AMPAS sofre com a diminuição dos índices de audiência da cerimônia do Oscar nos Estados Unidos, onde a emissora detentora dos direitos é a ABC, do grupo Disney. Isto se deve à fama do evento, considerado cansativo pela fatia mais jovem do público, que não se interessa o suficiente pelas produções que chegam entre as finalistas ao Golden Boy.
Desde os anos 1990, astros da música subiram ao palco da cerimônia, no auge de suas carreiras, como Bon Jovi, Madonna, Aerosmith e Justin Timberlake, mas nenhum deles, por si só, foi capaz de alavancar a audiência. Recentemente, a estratégia encontrada foi acenar para o cinema comercial, agraciando os títulos responsáveis por manter as engrenagens da indústria funcionando por meio da criação da categoria de melhor filme popular. Logo após o anúncio, a AMPAS recebeu inúmeras críticas negativas, acusando-a de favorecimento aos blockbusters, sobretudo de super-heróis, que têm como maior fonte de renda os títulos produzidos pela Marvel em parceria com a Disney. Adiada por tempo indeterminado, a nova categoria era o combo completo, segundo os detratores, para a casa do Mickey. Mas o mal-estar acometeu até mesmo os supostos favorecidos, que tinham como meta o prêmio de melhor filme. A equipe em questão é a de “Pantera Negra”, indicado a sete estatuetas.
Cravando suas garras nos livros de História da Academia como o primeiro título de super-herói a disputar o Oscar de melhor filme, o longa de Ryan Coogler certamente aumentará a audiência da festa, principalmente após sua merecida vitória no SAG Awards como melhor elenco, categoria que é um dos maiores termômetros do prêmio principal da AMPAS. Além disto, atende às exigências da opinião pública e da imprensa no que tange à diversidade e representatividade, sobretudo após a polêmica do Oscar 2016, chamado de “#OscarSoWhite” (Oscar tão branco, numa tradução literal). Neste ponto, as 10 indicações do mexicano “Roma”, líder desta edição ao lado de “A Favorita” (The Favourite – 2018), também se encaixam nas mesmas exigências. Mas vão mais além.
Primeira produção original Netflix a competir pela estatueta principal, o filme de Alfonso Cuarón precisou seguir as regras para chegar ao palco do Dolby Theater na noite de 24 de fevereiro, entrando em cartaz comercialmente em salas americanas – mesmo assim, não houve o habitual intervalo de 90 dias, imposto pelas redes de cinema aos estúdios, entre a estreia nas salas e a liberação em plataformas digitais. A atitude da AMPAS abriu as portas da Motion Picture Association of America (MPAA) para a gigante do streaming, que agora figura ao lado dos estúdios tradicionais. “Todos os nossos membros estão comprometidos em levar a indústria cinematográfica e televisiva adiante, tanto na forma como contamos histórias quanto como atingimos o público. Adicionar a Netflix nos permitirá defender de forma mais eficaz a comunidade global de contadores de histórias criativos, e estou ansioso para ver o que todos podemos conseguir juntos”, disse Chales Rivkin, presidente da MPAA, em comunicado oficial no último dia 22.
Num primeiro momento, as indicações ao Oscar e o ingresso na MPAA podem parecer uma acolhida de Hollywood. Mas não é, pois os estúdios continuam se opondo à ascensão da Netflix porque sabem da necessidade do lucro em bilheterias. O que nos leva de volta à AMPAS. “Roma” só chegou ao Oscar por ser um produto da grife Alfonso Cuarón, que, em 2014, se tornou o primeiro mexicano a vencer o Oscar de melhor direção, por “Gravidade” (Gravity – 2013), que também lhe rendeu a estatueta de edição. Ou seja, sua nomeação não é somente uma simples quebra de barreiras nem um abraço caloroso ao streaming. É uma reverência a Cuarón e principalmente um gesto político. Uma espécie de manifesto da indústria contra o governo do presidente Donald Trump e suas controversas medidas migratórias, dentre elas, a construção de um muro na fronteira entre Estados Unidos e México. Portanto, é um filme que, para a Academia, se encaixa num momento político delicado.
Tais manifestações são uma constante na capital do cinema, que assimila os problemas políticos, econômicos e sociais em suas obras. E são nos períodos conturbados que Hollywood costuma acenar para outros mercados e vertentes. Foi assim na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), quando o mercado europeu ficou limitado, obrigando-a a olhar para a América Latina. E é assim agora em relação aos imigrantes, sobretudo ilegais.
O Oscar 2019 será bastante peculiar, pois unirá o pop dos personagens da Marvel e de Lady Gaga – primeira mulher a concorrer aos prêmios de melhor atriz e canção original (“Shallow”), ambos por “Nasce Uma Estrela” (A Star is Born – 2018), na mesma edição – à política. Se “Roma” for coroado melhor filme, não será um convite à Netflix, mas uma maneira de dizer à Casa Branca que Hollywood não está ao seu lado.