No Brasil, é comum ouvir que o ano só começa depois do Carnaval. As férias de verão acabam, as aulas recomeçam, as atividades entram no ritmo, a economia acelera. Desta vez, com a folia suspensa por causa da pandemia, a dúvida é: quando, afinal, 2021 vai engrenar? Por que muita gente tem a sensação de […]
POR Redação SRzd15/02/2021|7 min de leitura
No Brasil, é comum ouvir que o ano só começa depois do Carnaval. As férias de verão acabam, as aulas recomeçam, as atividades entram no ritmo, a economia acelera. Desta vez, com a folia suspensa por causa da pandemia, a dúvida é: quando, afinal, 2021 vai engrenar? Por que muita gente tem a sensação de que 2020 não terminou?
Para o mestre em psicologia Guilherme Alcântara Ramos, professor do Unicuritiba, membro do Núcleo de Atendimento Psicopedagógico da instituição e coordenador da Comissão de Psicologia Organizacional e do Trabalho do Conselho Regional de Psicologia, o cancelamento do Carnaval – e também do Réveillon – em função da pandemia, provocou a sensação de que 2020 foi um “ano sem fim”.
“Esses eventos são ritos culturais consolidados no Brasil como fases de transição e têm um efeito psicológico importante. Mesmo quem voltou ao trabalho em janeiro tem o Carnaval como um marco temporal. Esses momentos demarcam uma nova fase que nos prepara para enfrentar as demandas futuras e, portanto, a não realização destas festas torna seu efeito simbólico mais frágil, provocando essa sensação de que algo está faltando e de que não estamos adequadamente preparados para o que está por vir”, explica.
Os impactos não são apenas psicológicos. A falta destes “marcadores” a que se refere o professor tem reflexos também na economia do país.
“É muito difícil pensar no começo de um novo ano, uma vez que a pandemia ainda não acabou. Infelizmente, os foliões ficaram sem Carnaval e a economia, sem pós-Carnaval”, avalia a economista Patrícia Tendolini Oliveira, mestre em Administração e coordenadora do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
A retomada, continua a profissional, está na expectativa de medidas como o novo auxílio emergencial (ainda que em uma versão diferente da adotada em 2020, com três parcelas de R$ 200 e menor abrangência), a antecipação do 13º do INSS, a reativação do programa de manutenção do emprego e a flexibilização das exigências para a concessão de crédito. “Essas iniciativas podem garantir uma certa retomada e uma melhora no ambiente econômico.”
Pandemia no centro das atenções
Mesmo que 2021 já tenha chegado, a tendência é que a vida continue girando em torno de um velho assunto: a pandemia. “Há estimativas de que apenas em setembro o Brasil alcance a chamada imunidade de rebanho, com boa parte da população vacinada, e só então a vida comece a voltar ao normal. Ainda assim há a possibilidade de novas cepas do vírus não serem combatidas pelas atuais vacinas, sob o risco de o problema se arrastar por mais tempo”, avalia a economista.
O psicólogo Guilherme Ramos concorda que o tema dominará a pauta nos próximos meses, impactando de forma significativa os processos de trabalho, emprego, renda, economia e as relações interpessoais. Tudo agravado pelo posicionamento divergente dos agentes públicos na condução do assunto.
“A divergência na conduta e nas comunicações confunde a sociedade e não cria um padrão de ações consistente a ser seguido pela população, aumentando a insegurança, os questionamentos, os conflitos, o esgotamento mental, o cansaço e essa sensação de que o ano não termina”, avalia.
Segundo Patrícia Tendolini, os reflexos são diretos na economia e embora a expectativa de crescimento gire em torno de 3,5% em 2021, o índice sequer recupera a queda de 2020, projetada para 4,3%.
“As medidas em estudo pelo governo federal podem representar uma leve melhora para a economia, mas a geração de emprego e renda no longo prazo vai muito além dessas ações pontuais e depende de fatores estruturais como produtividade da mão de obra, ambiente de negócios e segurança jurídica”.
Responsável por mais de 60% do PIB do Brasil, o setor de serviços pode contribuir para uma retomada econômica mais rápida, avalia a professora: “É importante que o comércio, restaurantes, bares, salões de beleza e serviços de transporte – atividades presentes em grandes e pequenas cidades – consigam retomar os negócios. O problema é que essas atividades são as que mais sofrem com o isolamento social e, portanto, são as que mais precisam da população imunizada contra o Coronavírus.”
Vacinação em massa
Na avaliação da mestre em Administração, Patrícia Tendolini, a sensação de normalidade tão desejada pelos brasileiros e a “confirmação” de que o ano, de fato, começou, vão depender da imunidade de rebanho. “A vacinação em massa é fundamental. As estabilidades econômica e política estão diretamente relacionadas e a confiança de empresários e consumidores, tanto na economia quanto na política, será essencial para pensar em um futuro promissor para o país.”
Enquanto a imunização da população não acontece e os grandes eventos – os marcos temporais que ajudam na programação mental – não podem ocorrer em função da pandemia, o psicólogo Guilherme Alcântara Ramos tem dicas. “Podemos fazer rituais particulares que vão criar essa condição psicológica, essa predisposição para lidarmos com o novo, com as novas demandas, os novos projetos. Podemos estabelecer um marco próprio e que cause o mesmo efeito, não precisa ser exatamente uma festa de Réveillon ou o Carnaval”, ensina.
Importância dos ritos de passagem
O professor Guilherme explica que os rituais de passagem são construções sociais e culturais importantes do ponto de vista emocional e psicológico. Ajudam, inclusive, a delimitar as formas como as pessoas são vistas socialmente.
É assim no aniversário de 18 anos, quando o indivíduo passa a ter novos direitos e deveres como cidadão; na formatura, quando deixa de ser estudante e se torna um profissional; no casamento, quando assume um novo status perante a sociedade. Mas não são apenas os grandes eventos que são importantes.
“Os rituais existem para aumentar a nossa predisposição diante de uma nova demanda. Em menor escala, são os ritos diários, como, por exemplo, tirar o pijama e se arrumar para o trabalho, mesmo que seja em home office. Isso nos faz sentir preparados para executar melhor as funções”, orienta.
É neste sentido que o especialista fala sobre a importância de cada pessoa criar seus próprios mecanismos para virar a chave e recomeçar outro ciclo. “Se estamos impedidos pela pandemia de participar dos marcos temporais tradicionais, com aglomeração, o jeito é ter rituais particulares e específicos que provoquem as mesmas sensações e nos preparem para encarar o novo ano. Não precisamos depender do Carnaval para isso”.
Covid-19 e a sobrecarga emocional
Não bastasse a confusão provocada pela ausência dos tradicionais rituais que garantem o início de novas fases na vida das pessoas, a pandemia também restringiu as opções de lazer e diversão. Na avaliação do professor Guilherme Alcântara Ramos, esse é outro complicador emocional.
“Além de termos que lidar com um inimigo invisível, o vírus da Covid-19 – o que torna o desafio do autocuidado e do cuidado com os outros ainda maior -, o trabalho invadiu as residências e as condições de lazer e diversão foram reduzidas. Estamos mais cansados e sobrecarregados. Precisamos criar condições prazerosas, seguras e lúdicas para lidar com as alterações que a pandemia impôs às nossas vidas”, comenta.
No Brasil, é comum ouvir que o ano só começa depois do Carnaval. As férias de verão acabam, as aulas recomeçam, as atividades entram no ritmo, a economia acelera. Desta vez, com a folia suspensa por causa da pandemia, a dúvida é: quando, afinal, 2021 vai engrenar? Por que muita gente tem a sensação de que 2020 não terminou?
Para o mestre em psicologia Guilherme Alcântara Ramos, professor do Unicuritiba, membro do Núcleo de Atendimento Psicopedagógico da instituição e coordenador da Comissão de Psicologia Organizacional e do Trabalho do Conselho Regional de Psicologia, o cancelamento do Carnaval – e também do Réveillon – em função da pandemia, provocou a sensação de que 2020 foi um “ano sem fim”.
“Esses eventos são ritos culturais consolidados no Brasil como fases de transição e têm um efeito psicológico importante. Mesmo quem voltou ao trabalho em janeiro tem o Carnaval como um marco temporal. Esses momentos demarcam uma nova fase que nos prepara para enfrentar as demandas futuras e, portanto, a não realização destas festas torna seu efeito simbólico mais frágil, provocando essa sensação de que algo está faltando e de que não estamos adequadamente preparados para o que está por vir”, explica.
Os impactos não são apenas psicológicos. A falta destes “marcadores” a que se refere o professor tem reflexos também na economia do país.
“É muito difícil pensar no começo de um novo ano, uma vez que a pandemia ainda não acabou. Infelizmente, os foliões ficaram sem Carnaval e a economia, sem pós-Carnaval”, avalia a economista Patrícia Tendolini Oliveira, mestre em Administração e coordenadora do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
A retomada, continua a profissional, está na expectativa de medidas como o novo auxílio emergencial (ainda que em uma versão diferente da adotada em 2020, com três parcelas de R$ 200 e menor abrangência), a antecipação do 13º do INSS, a reativação do programa de manutenção do emprego e a flexibilização das exigências para a concessão de crédito. “Essas iniciativas podem garantir uma certa retomada e uma melhora no ambiente econômico.”
Pandemia no centro das atenções
Mesmo que 2021 já tenha chegado, a tendência é que a vida continue girando em torno de um velho assunto: a pandemia. “Há estimativas de que apenas em setembro o Brasil alcance a chamada imunidade de rebanho, com boa parte da população vacinada, e só então a vida comece a voltar ao normal. Ainda assim há a possibilidade de novas cepas do vírus não serem combatidas pelas atuais vacinas, sob o risco de o problema se arrastar por mais tempo”, avalia a economista.
O psicólogo Guilherme Ramos concorda que o tema dominará a pauta nos próximos meses, impactando de forma significativa os processos de trabalho, emprego, renda, economia e as relações interpessoais. Tudo agravado pelo posicionamento divergente dos agentes públicos na condução do assunto.
“A divergência na conduta e nas comunicações confunde a sociedade e não cria um padrão de ações consistente a ser seguido pela população, aumentando a insegurança, os questionamentos, os conflitos, o esgotamento mental, o cansaço e essa sensação de que o ano não termina”, avalia.
Segundo Patrícia Tendolini, os reflexos são diretos na economia e embora a expectativa de crescimento gire em torno de 3,5% em 2021, o índice sequer recupera a queda de 2020, projetada para 4,3%.
“As medidas em estudo pelo governo federal podem representar uma leve melhora para a economia, mas a geração de emprego e renda no longo prazo vai muito além dessas ações pontuais e depende de fatores estruturais como produtividade da mão de obra, ambiente de negócios e segurança jurídica”.
Responsável por mais de 60% do PIB do Brasil, o setor de serviços pode contribuir para uma retomada econômica mais rápida, avalia a professora: “É importante que o comércio, restaurantes, bares, salões de beleza e serviços de transporte – atividades presentes em grandes e pequenas cidades – consigam retomar os negócios. O problema é que essas atividades são as que mais sofrem com o isolamento social e, portanto, são as que mais precisam da população imunizada contra o Coronavírus.”
Vacinação em massa
Na avaliação da mestre em Administração, Patrícia Tendolini, a sensação de normalidade tão desejada pelos brasileiros e a “confirmação” de que o ano, de fato, começou, vão depender da imunidade de rebanho. “A vacinação em massa é fundamental. As estabilidades econômica e política estão diretamente relacionadas e a confiança de empresários e consumidores, tanto na economia quanto na política, será essencial para pensar em um futuro promissor para o país.”
Enquanto a imunização da população não acontece e os grandes eventos – os marcos temporais que ajudam na programação mental – não podem ocorrer em função da pandemia, o psicólogo Guilherme Alcântara Ramos tem dicas. “Podemos fazer rituais particulares que vão criar essa condição psicológica, essa predisposição para lidarmos com o novo, com as novas demandas, os novos projetos. Podemos estabelecer um marco próprio e que cause o mesmo efeito, não precisa ser exatamente uma festa de Réveillon ou o Carnaval”, ensina.
Importância dos ritos de passagem
O professor Guilherme explica que os rituais de passagem são construções sociais e culturais importantes do ponto de vista emocional e psicológico. Ajudam, inclusive, a delimitar as formas como as pessoas são vistas socialmente.
É assim no aniversário de 18 anos, quando o indivíduo passa a ter novos direitos e deveres como cidadão; na formatura, quando deixa de ser estudante e se torna um profissional; no casamento, quando assume um novo status perante a sociedade. Mas não são apenas os grandes eventos que são importantes.
“Os rituais existem para aumentar a nossa predisposição diante de uma nova demanda. Em menor escala, são os ritos diários, como, por exemplo, tirar o pijama e se arrumar para o trabalho, mesmo que seja em home office. Isso nos faz sentir preparados para executar melhor as funções”, orienta.
É neste sentido que o especialista fala sobre a importância de cada pessoa criar seus próprios mecanismos para virar a chave e recomeçar outro ciclo. “Se estamos impedidos pela pandemia de participar dos marcos temporais tradicionais, com aglomeração, o jeito é ter rituais particulares e específicos que provoquem as mesmas sensações e nos preparem para encarar o novo ano. Não precisamos depender do Carnaval para isso”.
Covid-19 e a sobrecarga emocional
Não bastasse a confusão provocada pela ausência dos tradicionais rituais que garantem o início de novas fases na vida das pessoas, a pandemia também restringiu as opções de lazer e diversão. Na avaliação do professor Guilherme Alcântara Ramos, esse é outro complicador emocional.
“Além de termos que lidar com um inimigo invisível, o vírus da Covid-19 – o que torna o desafio do autocuidado e do cuidado com os outros ainda maior -, o trabalho invadiu as residências e as condições de lazer e diversão foram reduzidas. Estamos mais cansados e sobrecarregados. Precisamos criar condições prazerosas, seguras e lúdicas para lidar com as alterações que a pandemia impôs às nossas vidas”, comenta.