“Acredito que a música erudita nunca vai ser popular, mas eu tento popularizar. A música é muito importante na formação, independente da profissão”
Em entrevista exclusiva, o tenor Thiago Arancam fala sobre novos projetos, sua família e da escolha para protagonizar O Fantasma da Ópera “São sete apresentações por semana e 90 minutos de maquiagem. Para dar conta dessa rotina tenho que me policiar, fazendo exercícios, tendo cuidado com a minha voz”. Thiago Arancam mantém uma rigorosa […]
POR Nyldo Moreira22/08/2019|9 min de leitura
Em entrevista exclusiva, o tenor Thiago Arancam fala sobre novos projetos, sua família e da escolha para protagonizar O Fantasma da Ópera
“São sete apresentações por semana e 90 minutos de maquiagem. Para dar conta dessa rotina tenho que me policiar, fazendo exercícios, tendo cuidado com a minha voz”. Thiago Arancam mantém uma rigorosa disciplina para ser um dos importantes elementos de um dos mais exuberantes musicais do planeta. É o personagem que intitula o espetáculo, que aliás, dá um trabalho monumental para colocar esse tanto de sessões no palco e movimenta uma equipe enorme. O Fantasma da Ópera já passou de um ano em cartaz na capital paulista e entre glórias e desafios, como o afastamento do tenor após um acidente em cena, o sucesso de público continua garantido. A música, que move essa gente ao teatro, é a mesma que norteia a vida de Arancam.
Entrevistando o tenor, volta e meia a música se faz presente na conversa. Também pudera, seu nome é destaque no rol dos maiores na música clássica. Arancam já cantou com nada mais, nada menos do que Plácido Domingos e esteve em grandes musicais. Ele já é pai de dois filhos, Francisco, ainda recém-nascido, ouve atentamente a tessitura firme do pai pronunciando seu nome arrastando um sotaque italiano, provocado por seu tempo em que viveu na Itália. “No que depender de mim, a música sempre estará presente na vida dele. E eu diria que já está!” Durante o nascimento do caçula o tenor cantou na sala de parto: “Esse é um momento que ficará pra sempre marcado em minha memória”.
Já Diego, o primeiro filho de Arancam, com cinco anos sempre que possível acompanha o pai nos ensaios. “Cantar com ele, seja pessoalmente ou virtualmente, é uma forma de nos unirmos mesmo com a distância”.
Esse lastro musical começou a fazer parte da vida do tenor muito cedo, quando ele tinha apenas seis anos, na escola. “Todas as crianças faziam um teste cantando a música ‘Parabéns a você’, e o maestro avaliava quem estava apto a participar do coral. Eu passei e acabei ficando três anos no coral da escola”. Sua mãe, ao perceber o talento, inscreveu o menino em outro coral, aos 12 anos. Dali em diante, Arancam foi se envolvendo cada vez mais com o canto erudito.
“Acredito que a música é muito importante na formação, independente se a pessoa queira usá-la como um instrumento de profissão ou não” – foi assim que o tenor resumiu o quanto seria fundamental se o sistema de ensino adotasse aulas de música no currículo escolar.
Volta e meia é discutida a cultura da música erudita no Brasil, que estaria ainda sobreposta pela música popular, como o samba e outros ritmos. Mas, sessões lotadas em espetáculos como o protagonizado por Arancam começam a desfazer essa tal realidade. Talvez possam dizer que por ser um musical luxuoso, bem divulgado e consagrado, o público está mais do que garantido. Mas, estamos diante de estádios lotados com shows de Andrea Bocelli, por exemplo e ingressos esgotados de óperas no Teatro Municipal e em concertos na Sala São Paulo. “Multicultural”, é como Arancam chama o Brasil.
Nessa direção ele diz que é “claro que existe uma tendência para a música popular, por ganhar mais força ao ser cantada em português. A MPB serve como fonte de inspiração e produção de outros projetos. A música popular brasileira sempre esteve presente na minha vida”. Em um novo projeto de turnê, Arancam deve incluir músicas da MPB.
“Na minha infância ouvia muito Cazuza, Lulu Santos, Paralamas do Sucesso e Legião Urbana. Hoje em dia continuo ouvindo esses cantores e as novidades que vão sendo lançadas, sempre buscando novas músicas para aumentar meu repertório”. Acreditando que a música erudita nunca será popular, o tenor vem tentando popularizar esse estilo. “Quero usar a música como uma forma de inclusão social, para que ela chegue em todas as camadas sociais e em todas as faixas etárias”. Arancam já esteve em projetos filantrópicos ao longo de sua carreira e diz que pretende dar continuidade a eles como uma maneira de incluir a música em causas sociais e levar o nome do Brasil afora.
A música clássica quase perdeu Arancam para a mecatrônica, isso também quase aconteceu com Luciano Pavarotti, que sonhava em ser goleiro de futebol. “Mesmo assim eu usava os aprendizados em aula [no curso de mecatrônica] para mexer nos aparelhos de som”.
Mas, a música de fato fisgou o menino, que estudou na Escola Municipal de Música de São Paulo e na Faculdade de Música Carlos Gomes, por onde formou-se bacharel. Venceu o Concurso Internacional de Canto Erudito Bidu Sayão, em 2014, e entrou para a Academia de Canto Lírico do Teatro Alla Scala, de Milão.
Todo esse percurso levou Arancam para os palcos no mundo, inclusive à Ópera Carmem di Bizet. No ano passado foi convidado para as audições de O Fantasma da Ópera, no Brasil. Foram quatro audições até ser selecionado pelo próprio autor do espetáculo, Andrew Lloyd Webber, que criou o musical para estrelar Sarah Brightman no papel de Christine Daaé. Com o tenor brasileiro, já foram mais de 300 apresentações, além de algumas exibições que contam com substituições.
“Eu acredito que O Fantasma da Ópera seja o musical dos musicais. Poder ser o Fantasma no meu país, poder carregar essa máscara tão icônica em uma produção tão importante é algo que me deixa muito satisfeito. É muito bom poder executar uma arte tão importante no nosso país. No ano passado, quando faltavam apenas 10 minutos para o fim do espetáculo, Arancam sofreu um acidente no palco: “em uma cena onde todos correm, meu figurino entrou embaixo do meu pé. Acabei escorregando e bati a minha clavícula no chão. Imprevistos que podem acontecer em um show ao vivo, não é? Foram dois meses de bastante repouso e sessões de fisioterapia para que eu pudesse retornar aos palcos”.
A produção da Time For Fun, que permanece em cartaz no Teatro Renault, tem uma cena memorável para o protagonista. Arancam destaca a parte em que seu personagem, o Fantasma, sofre uma desilusão amorosa ao flagrar Christine e Raul juntos. “Essa cena permeia uma bonita canção que eu interpreto em uma estrutura de anjo montada em cima do palco. O público se surpreende com essa aparição inusitada”.
A luta do Fantasma, que vive no porão de um antigo teatro, pelo amor de Christine é acirrada por Raul, que também tenta conquistar o coração da soprano que passa a se apresentar em espetáculos. O Fantasma, que carrega uma cicatriz no rosto, escondida por uma máscara, passa a assombrar as dependências do teatro e tenta espantar as visitas ao local. O imenso lustre que passa por cima dos espectadores na plateia é um dos pontos altos do espetáculo, sobretudo quando cai sobre o palco, deixando-o em ruínas.
Nos bastidores do musical, Arancam distribuí piadas pelos corredores. Suas charadas estão famosas nos stories do Instagram. Cozinhar em casa também é um hobbie. Quando pergunto o que mais gosta, ele ri e diz: “pode escolher os dois?”
Conciliando com o musical, o tenor ainda percorre o Brasil com a turnê “Bela Primavera”, um show com músicas clássicas e com uma pegada mais pop. “E já estou com outros projetos para o futuro”, lembrando que músicas populares brasileiras estarão no setlist. “No musical e na ópera eu tenho que contar uma história e dar vida a um personagem. No caso da turnê, eu faço uma interpretação em que dou vida a mim mesmo, Thiago Arancam. E o José Possi Neto [que dirige o show Bela Primavera] me ajudou a fazer isso da melhor forma possível. Assim que encerrar essa turnê, o novo projeto incluí a América Latina e deve ter um contexto mais romântico. “Também estou aberto a novos projetos e desafios”.
A leitura de Arancam sobre sua carreira é muito singela, apesar da grandiosidade de cada passagem. “Tive a sorte de ser considerado um dos grandes cantores em tão pouco tempo. Eu sempre soube lidar com isso de uma forma natural, até porque eu quero me superar a cada passagem. Eu nunca me considero o melhor nesse sentido todo, mas me considero um cara que está em plena evolução”.
Serviço – O Fantasma da Ópera
Teatro Renault – São Paulo
Quartas, quintas e sextas às 21h
Sábados às 16h e 21h
Domingos às 15h e 20h
Em entrevista exclusiva, o tenor Thiago Arancam fala sobre novos projetos, sua família e da escolha para protagonizar O Fantasma da Ópera
“São sete apresentações por semana e 90 minutos de maquiagem. Para dar conta dessa rotina tenho que me policiar, fazendo exercícios, tendo cuidado com a minha voz”. Thiago Arancam mantém uma rigorosa disciplina para ser um dos importantes elementos de um dos mais exuberantes musicais do planeta. É o personagem que intitula o espetáculo, que aliás, dá um trabalho monumental para colocar esse tanto de sessões no palco e movimenta uma equipe enorme. O Fantasma da Ópera já passou de um ano em cartaz na capital paulista e entre glórias e desafios, como o afastamento do tenor após um acidente em cena, o sucesso de público continua garantido. A música, que move essa gente ao teatro, é a mesma que norteia a vida de Arancam.
Entrevistando o tenor, volta e meia a música se faz presente na conversa. Também pudera, seu nome é destaque no rol dos maiores na música clássica. Arancam já cantou com nada mais, nada menos do que Plácido Domingos e esteve em grandes musicais. Ele já é pai de dois filhos, Francisco, ainda recém-nascido, ouve atentamente a tessitura firme do pai pronunciando seu nome arrastando um sotaque italiano, provocado por seu tempo em que viveu na Itália. “No que depender de mim, a música sempre estará presente na vida dele. E eu diria que já está!” Durante o nascimento do caçula o tenor cantou na sala de parto: “Esse é um momento que ficará pra sempre marcado em minha memória”.
Já Diego, o primeiro filho de Arancam, com cinco anos sempre que possível acompanha o pai nos ensaios. “Cantar com ele, seja pessoalmente ou virtualmente, é uma forma de nos unirmos mesmo com a distância”.
Esse lastro musical começou a fazer parte da vida do tenor muito cedo, quando ele tinha apenas seis anos, na escola. “Todas as crianças faziam um teste cantando a música ‘Parabéns a você’, e o maestro avaliava quem estava apto a participar do coral. Eu passei e acabei ficando três anos no coral da escola”. Sua mãe, ao perceber o talento, inscreveu o menino em outro coral, aos 12 anos. Dali em diante, Arancam foi se envolvendo cada vez mais com o canto erudito.
“Acredito que a música é muito importante na formação, independente se a pessoa queira usá-la como um instrumento de profissão ou não” – foi assim que o tenor resumiu o quanto seria fundamental se o sistema de ensino adotasse aulas de música no currículo escolar.
Volta e meia é discutida a cultura da música erudita no Brasil, que estaria ainda sobreposta pela música popular, como o samba e outros ritmos. Mas, sessões lotadas em espetáculos como o protagonizado por Arancam começam a desfazer essa tal realidade. Talvez possam dizer que por ser um musical luxuoso, bem divulgado e consagrado, o público está mais do que garantido. Mas, estamos diante de estádios lotados com shows de Andrea Bocelli, por exemplo e ingressos esgotados de óperas no Teatro Municipal e em concertos na Sala São Paulo. “Multicultural”, é como Arancam chama o Brasil.
Nessa direção ele diz que é “claro que existe uma tendência para a música popular, por ganhar mais força ao ser cantada em português. A MPB serve como fonte de inspiração e produção de outros projetos. A música popular brasileira sempre esteve presente na minha vida”. Em um novo projeto de turnê, Arancam deve incluir músicas da MPB.
“Na minha infância ouvia muito Cazuza, Lulu Santos, Paralamas do Sucesso e Legião Urbana. Hoje em dia continuo ouvindo esses cantores e as novidades que vão sendo lançadas, sempre buscando novas músicas para aumentar meu repertório”. Acreditando que a música erudita nunca será popular, o tenor vem tentando popularizar esse estilo. “Quero usar a música como uma forma de inclusão social, para que ela chegue em todas as camadas sociais e em todas as faixas etárias”. Arancam já esteve em projetos filantrópicos ao longo de sua carreira e diz que pretende dar continuidade a eles como uma maneira de incluir a música em causas sociais e levar o nome do Brasil afora.
A música clássica quase perdeu Arancam para a mecatrônica, isso também quase aconteceu com Luciano Pavarotti, que sonhava em ser goleiro de futebol. “Mesmo assim eu usava os aprendizados em aula [no curso de mecatrônica] para mexer nos aparelhos de som”.
Mas, a música de fato fisgou o menino, que estudou na Escola Municipal de Música de São Paulo e na Faculdade de Música Carlos Gomes, por onde formou-se bacharel. Venceu o Concurso Internacional de Canto Erudito Bidu Sayão, em 2014, e entrou para a Academia de Canto Lírico do Teatro Alla Scala, de Milão.
Todo esse percurso levou Arancam para os palcos no mundo, inclusive à Ópera Carmem di Bizet. No ano passado foi convidado para as audições de O Fantasma da Ópera, no Brasil. Foram quatro audições até ser selecionado pelo próprio autor do espetáculo, Andrew Lloyd Webber, que criou o musical para estrelar Sarah Brightman no papel de Christine Daaé. Com o tenor brasileiro, já foram mais de 300 apresentações, além de algumas exibições que contam com substituições.
“Eu acredito que O Fantasma da Ópera seja o musical dos musicais. Poder ser o Fantasma no meu país, poder carregar essa máscara tão icônica em uma produção tão importante é algo que me deixa muito satisfeito. É muito bom poder executar uma arte tão importante no nosso país. No ano passado, quando faltavam apenas 10 minutos para o fim do espetáculo, Arancam sofreu um acidente no palco: “em uma cena onde todos correm, meu figurino entrou embaixo do meu pé. Acabei escorregando e bati a minha clavícula no chão. Imprevistos que podem acontecer em um show ao vivo, não é? Foram dois meses de bastante repouso e sessões de fisioterapia para que eu pudesse retornar aos palcos”.
A produção da Time For Fun, que permanece em cartaz no Teatro Renault, tem uma cena memorável para o protagonista. Arancam destaca a parte em que seu personagem, o Fantasma, sofre uma desilusão amorosa ao flagrar Christine e Raul juntos. “Essa cena permeia uma bonita canção que eu interpreto em uma estrutura de anjo montada em cima do palco. O público se surpreende com essa aparição inusitada”.
A luta do Fantasma, que vive no porão de um antigo teatro, pelo amor de Christine é acirrada por Raul, que também tenta conquistar o coração da soprano que passa a se apresentar em espetáculos. O Fantasma, que carrega uma cicatriz no rosto, escondida por uma máscara, passa a assombrar as dependências do teatro e tenta espantar as visitas ao local. O imenso lustre que passa por cima dos espectadores na plateia é um dos pontos altos do espetáculo, sobretudo quando cai sobre o palco, deixando-o em ruínas.
Nos bastidores do musical, Arancam distribuí piadas pelos corredores. Suas charadas estão famosas nos stories do Instagram. Cozinhar em casa também é um hobbie. Quando pergunto o que mais gosta, ele ri e diz: “pode escolher os dois?”
Conciliando com o musical, o tenor ainda percorre o Brasil com a turnê “Bela Primavera”, um show com músicas clássicas e com uma pegada mais pop. “E já estou com outros projetos para o futuro”, lembrando que músicas populares brasileiras estarão no setlist. “No musical e na ópera eu tenho que contar uma história e dar vida a um personagem. No caso da turnê, eu faço uma interpretação em que dou vida a mim mesmo, Thiago Arancam. E o José Possi Neto [que dirige o show Bela Primavera] me ajudou a fazer isso da melhor forma possível. Assim que encerrar essa turnê, o novo projeto incluí a América Latina e deve ter um contexto mais romântico. “Também estou aberto a novos projetos e desafios”.
A leitura de Arancam sobre sua carreira é muito singela, apesar da grandiosidade de cada passagem. “Tive a sorte de ser considerado um dos grandes cantores em tão pouco tempo. Eu sempre soube lidar com isso de uma forma natural, até porque eu quero me superar a cada passagem. Eu nunca me considero o melhor nesse sentido todo, mas me considero um cara que está em plena evolução”.