As denúncias de pressão psicológica e vigilância velada na formulação do Enem 2021, além da fala do presidente Jair Bolsonaro de que as questões “teriam a cara do governo”, acenderam um alerta para os estudantes que se preparam para realizar a prova, cuja primeira etapa será neste domingo (21).
A prova é usada para entrada na maioria das universidades brasileiras e, normalmente, os participantes se preparam durante meses, ou até anos, para fazê-la. Diante disso, há a possibilidade de que, em 2021, haja muitas mudanças no Enem?
Para Maria Inês Fini, idealizadora do exame e ex-presidente do Inep, a prova não deve sofrer uma alteração tão radical. “Se aconteceu alguma interferência, foi a censura de itens. Mas temos que assegurar aos estudantes que as questão estão configuradas da mesma maneira e que, se eles se prepararam para o Enem, podem ter tranquilidade no domingo”, diz.
Segundo ela, é necessário que os participantes compareçam à prova, que é uma “grande oportunidade” para ingressar no ensino superior. “Não podemos permitir que eles faltem às provas”, reforça a educadora.
Marina Castellani, diretora pedagógica da Escola Mais, rede de educação básica, afirma que as denúncias relacionadas ao governo podem sim comprometer a estrutura, essência e objetivo do Enem. “Mas, neste momento, não sabemos avaliar em que medida a prova foi alterada, se foi em sua essência ou no âmbito das temáticas da redação”, avalia.
“As temáticas que o Enem vem praticando, a formulação das questões do exame desde o início, são implicadas nas questões contemporâneas e isso é fundamental para avaliarmos as habilidades e o conhecimento dos jovens, uma vez que eles estão indo para uma etapa de formação para a vida profissional”, complementa.
Nesta quinta-feira (18), o Tribunal de Contas da União (TCU) abriu investigação para apurar irregularidades no Enem. Danilo Rupas, atual presidente do Inep, é acusado de interferir no conteúdo da prova.
Além disso, segundo reportagem da “Folha de São Paulo”, Bolsonaro teria mandado trocar, no primeiro semestre deste ano, a palavra “golpe” por “revolução”, referindo-se a 1964.
Como funciona o Enem
O Enem é composto por uma prova de redação e quatro provas com 45 questões objetivas cada: linguagens, matemática, ciências humanas e ciências da natureza.
Os itens do Enem são elaborados por especialistas selecionados por meio de chamada pública do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Eles devem seguir a matriz de referência, guia de elaboração e revisão de itens estabelecidos pelo Inep. Após escritos, os itens passam, então, por revisores e depois por especialistas do Inep.
Finalmente, os itens são pré-testados em aplicações feitas em escolas pelo país. O processo é sigiloso e os estudantes não sabem que estão respondendo a possíveis questões do Enem. Com a aplicação, avalia-se a dificuldade, o grau de discriminação e a probabilidade de acerto ao acaso da questão. Os itens aprovados passam a compor o BNI, que fica disponível para aplicações futuras do Enem.
Acesso ao BNI
Para ter acesso ao BNI, é preciso seguir um protocolo de segurança. Todos os servidores e colaboradores com autorização de acesso aos itens assinam termos de sigilo e confidencialidade.
O BNI fica no Ambiente Físico Integrado Seguro, localizado na sede do Inep, em Brasília. O ambiente fica isolado, possui salas com abertura somente com o uso de digitais e computadores sem acesso à internet ou à intranet da autarquia.
Todo o processo de captação, elaboração e revisão de itens para compor o Enem e outros exames do instituto ocorre nesse espaço. Não se sabe ao certo quantas questões compõem o banco do Enem, pois a informação é sigilosa.
Elaboração das provas
As questões que vão compor a prova do Enem são selecionadas no final do primeiro semestre do ano, por especialistas do Inep, com auxílio de professores de diversas instituições de ensino básico e superior. A seleção, de acordo com cartilha disponibilizada pelo Inep, leva em conta a cobertura da matriz de habilidades e competências de cada área do conhecimento, bem como a atualidade das temáticas dos itens e seus parâmetros psicométricos.
As questões são selecionadas de forma que o nível de dificuldade das provas seja o mesmo todos os anos. Assim, é possível comparar o desempenho dos candidatos em anos diferentes. Em 2021, as questões do Enem impresso e do digital serão as mesmas. O tema da redação também será igual.
Selecionados, o tema da redação e as questões da prova são salvos em um HD levado de avião, por um servidor do Inep, até a gráfica de segurança máxima, onde o exame é impresso. Outro servidor embarca, em um avião diferente, levando a senha que permitirá a abertura dos arquivos do HD.
A videoprova em Língua Brasileira de Sinais (Libras) é gravada em um estúdio montado dentro do Ambiente Físico Integrado Seguro, no Inep. Os DVDs com o conteúdo da prova também são enviados para a gráfica. As provas são empacotadas e recebem lacres de segurança, que registram o momento em que os malotes são abertos. Os pacotes das provas são separados por sala e local de aplicação. Todo esse processo é feito pelo menos três meses antes da aplicação do exame.
O processo de elaboração da prova ganhou evidência na reta final para a realização do Enem. Este mês, servidores do Inep realizaram ato para denunciar problemas que vêm ocorrendo na atual gestão do presidente Danilo Dupas. O ato culminou no pedido de exoneração dos cargos ocupados por 37 servidores.
Diante dessa situação, a Defensoria Pública da União (DPU) acionou a Justiça Federal para pedir ao Inep documentos que comprovem as medidas que estão sendo tomadas pela autarquia para garantir a segurança do Enem. Tanto Dupas quanto o ministro da Educação, Milton Ribeiro, negam que tenha havido fraude na prova e garantiram a realização do Enem.
Em 2019, o Inep chegou a criar uma comissão para definir o que não seria usado no Enem. O grupo fez uma análise dos itens da BNI. Em sessão no Senado Federal, esta semana, Dupas afirmou que as provas do Enem 2021 “foram montadas pela equipe técnica seguindo a metodologia que vem sendo adotada, a Teoria de Resposta ao Item (TRI). A prova possui um conjunto de questões de diversos níveis de dificuldade que são calibradas para garantir um certo nível de prova. É comum, portanto, que durante a montagem da prova tenha itens que são colocados e itens que são retirados justamente para garantir o nivelamento das provas”.
Enem 2021
O Enem será aplicado nos dias 21 e 28 de novembro para mais de 3 milhões de estudantes em todo o país, tanto na versão impressa quanto na versão digital. No primeiro dia de prova, os participantes farão as provas de linguagens, ciências humanas e redação. No segundo, matemática e ciências da natureza. Os locais de prova estão disponíveis no Cartão de Confirmação de Inscrição na Página do Participante.
* Com informações da Agência Brasil e Revista Fórum