Há mais de cem anos, a disputa pela liderança no quadro de medalhas não era tão acirrada. No último dia dos Jogos de Tóquio, os Estados Unidos passaram a China, somando 39 ouros, contra 38. Foi a terceira vez na história que os dois primeiros colocados ficaram separados por apenas uma medalha dourada.
Na última, em 1912, na Suécia, os norte-americanos bateram os donos da casa por 25 a 24. A outra foi na primeira olimpíada da era moderna, com os EUA vencendo a Grécia, em Atenas, por 11 a 10.
Na reta final, os Estados Unidos encostaram no quadro de medalhas, prometendo uma disputa emocionante. Depois de abrir o sábado com sete ouros de distância, a China manteve o primeiro posto, mas viu a liderança cair para apenas dois ao fim do dia. Das 14 medalhas douradas em jogo no domingo de encerramento da olimpíada Tóquio 2020, os EUA estão garantidos em quatro. Já os chineses, em uma.
Nas últimas seis edições, desde Atlanta 96, os EUA só não ficaram no topo justamente quando os chineses foram os anfitriões, em Pequim 2008. Já os asiáticos chegaram ao terceiro lugar na tabela de medalhas em Atenas 2004. Desde então, não saíram mais do “pódio” da tabela, oscilando entre os três degraus. Rússia e Grã-Bretanha se alternaram para completar os três primeiros. E pensar que 16 anos antes, em Seul 88, a China ficou apenas em 11º lugar.
A busca pela hegemonia no maior evento esportivo do mundo reflete uma rivalidade que vai muito além do esporte. Para chegar ao topo valem alguns truques, como investir pesado (com perdão do trocadilho!) no levantamento de peso feminino. Só nessa modalidade pouco explorada no Ocidente foram três ouros e uma prata. Aliás, se o levantamento de peso não fosse esporte olímpico, contando também os homens, a China teria sete ouros a menos, ou 31 no total, o que deixaria o país em segundo no quadro de medalhas. O investimento nos esportes individuais faz sentido, já que aumenta as chances de retorno. São modalidades que distribuem mais medalhas, não exigem a formação de seleções inteiras e permitem ao país colocar mais de um competidor no torneio, abrindo espaço para eventualmente conquistar até os três lugares do pódio. No futebol são 22 jogadores para uma única medalha. No handebol, 15. No vôlei e no basquete, 12 cada… São justamente as modalidades por equipes que aumentam as possibilidades de os EUA virarem o jogo aos 45 do segundo tempo. Mas a China também vem avançando nos esportes coletivos. Quem sabe comece a colher os frutos em Paris-2024, ou um pouco mais adiante? Se tem uma coisa que não falta aos chineses é paciência. As glórias olímpicas são uma questão de afirmação: tanto para o público interno, quanto para o externo. Uma poderosa ação de relações públicas que reforça a imagem de uma potência que forja atletas do mais alto nível. E também a de um país capaz de oferecer produtos e serviços tão bons, ou até melhores do que os dos concorrentes. Uma nação que tem a maior e mais moderna rede de trens de alta velocidade do mundo, que manda missões tripuladas ao espaço, que planeja se tornar o principal polo mundial de tecnologia nos próximos 20 anos…
A estratégia de usar o esporte como cartão de visitas é parecida com aquela adotada pela União Soviética e outros países do bloco socialista durante a Guerra Fria. Mas com uma diferença importante: apesar da acirrada disputa por influência política, os soviéticos nunca chegaram a ameaçar de fato a hegemonia econômica dos norte-americanos. Já a China caminha a passos largos para isso.
Quando conquistou o 11º lugar no quadro de medalhas, em 1988, a China era também a 11ª economia do mundo. Quatro anos depois, já assumia o quarto posto nas medalhas e o décimo no Produto Interno Bruto (PIB). Quando sediou a olimpíada, em 2008, e liderou a corrida pelo ouro, já era a terceira maior economia. Hoje, prestes a repetir a façanha, tem o segundo maior PIB do mundo. E, pelas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), até o fim da década, ultrapassará os EUA em poder econômico. Talvez lidere antes mesmo de Los Angeles receber os Jogos pela terceira vez, em 2028.
Quem usa produtos da Apple, principalmente iPhone, já deve ter lido atrás do aparelho: “Made in China, Designed in California” (Fabricado na China, Projetado na Califórnia). Até não muito tempo atrás, as indústrias chinesas apenas fabricavam os produtos dos outros, de marcas consagradas no Ocidente. Mas isso vem mudando rapidamente. Uma semana antes da cerimônia de abertura em Tóquio, um levantamento da consultoria Canalys Research, especializada em tecnologia, mostrou que a chinesa Xiaomi ultrapassou a Apple e se tornou a segunda maior fabricante de celulares do mundo, atrás da sul-coreana Samsung.
A China é hoje a nação que mais tem negócios com outros países. Segundo a Conferência das Nações Unidas para Comércio de Desenvolvimento (Unctad), em 2020, os chineses foram responsáveis por 15% do comércio mundial. Crescem não apenas no ramo dos produtos físicos, onde lideram em áreas como painéis solares, ônibus elétricos e equipamentos de telefonia 5G, mas também avançam rapidamente nas redes sociais, com o TikTok, por exemplo. Têm ainda alguns dos títulos mais populares de jogos eletrônicos do mundo, como Honor of Kings e League of Legends. São marcas controladas pela estatal Tencent, uma gigante não tão conhecida fora da China, que ao invés de medalhas de ouro, prata e bronze, garimpa informações de usuários na rede, ativo que muitos consideram o petróleo do século XXI. Antes mesmo da cerimônia de encerramento em Tóquio, os chineses estão de olho nos próximos Jogos. Paris? Não. Todas as atenções se voltam para a olimpíada de inverno de 2022, que será disputada daqui a apenas seis meses, em Pequim. Mais uma oportunidade de surpreender o mundo em modalidades nas quais tem pouca tradição e de se afirmar como potência: dentro e fora da instalações esportivas.
Há mais de cem anos, a disputa pela liderança no quadro de medalhas não era tão acirrada. No último dia dos Jogos de Tóquio, os Estados Unidos passaram a China, somando 39 ouros, contra 38. Foi a terceira vez na história que os dois primeiros colocados ficaram separados por apenas uma medalha dourada.
Na última, em 1912, na Suécia, os norte-americanos bateram os donos da casa por 25 a 24. A outra foi na primeira olimpíada da era moderna, com os EUA vencendo a Grécia, em Atenas, por 11 a 10.
Na reta final, os Estados Unidos encostaram no quadro de medalhas, prometendo uma disputa emocionante. Depois de abrir o sábado com sete ouros de distância, a China manteve o primeiro posto, mas viu a liderança cair para apenas dois ao fim do dia. Das 14 medalhas douradas em jogo no domingo de encerramento da olimpíada Tóquio 2020, os EUA estão garantidos em quatro. Já os chineses, em uma.
Nas últimas seis edições, desde Atlanta 96, os EUA só não ficaram no topo justamente quando os chineses foram os anfitriões, em Pequim 2008. Já os asiáticos chegaram ao terceiro lugar na tabela de medalhas em Atenas 2004. Desde então, não saíram mais do “pódio” da tabela, oscilando entre os três degraus. Rússia e Grã-Bretanha se alternaram para completar os três primeiros. E pensar que 16 anos antes, em Seul 88, a China ficou apenas em 11º lugar.
A busca pela hegemonia no maior evento esportivo do mundo reflete uma rivalidade que vai muito além do esporte. Para chegar ao topo valem alguns truques, como investir pesado (com perdão do trocadilho!) no levantamento de peso feminino. Só nessa modalidade pouco explorada no Ocidente foram três ouros e uma prata. Aliás, se o levantamento de peso não fosse esporte olímpico, contando também os homens, a China teria sete ouros a menos, ou 31 no total, o que deixaria o país em segundo no quadro de medalhas. O investimento nos esportes individuais faz sentido, já que aumenta as chances de retorno. São modalidades que distribuem mais medalhas, não exigem a formação de seleções inteiras e permitem ao país colocar mais de um competidor no torneio, abrindo espaço para eventualmente conquistar até os três lugares do pódio. No futebol são 22 jogadores para uma única medalha. No handebol, 15. No vôlei e no basquete, 12 cada… São justamente as modalidades por equipes que aumentam as possibilidades de os EUA virarem o jogo aos 45 do segundo tempo. Mas a China também vem avançando nos esportes coletivos. Quem sabe comece a colher os frutos em Paris-2024, ou um pouco mais adiante? Se tem uma coisa que não falta aos chineses é paciência. As glórias olímpicas são uma questão de afirmação: tanto para o público interno, quanto para o externo. Uma poderosa ação de relações públicas que reforça a imagem de uma potência que forja atletas do mais alto nível. E também a de um país capaz de oferecer produtos e serviços tão bons, ou até melhores do que os dos concorrentes. Uma nação que tem a maior e mais moderna rede de trens de alta velocidade do mundo, que manda missões tripuladas ao espaço, que planeja se tornar o principal polo mundial de tecnologia nos próximos 20 anos…