Como sabemos, não são raros os casos de marcas famosas que ganham apelidos, em fenômeno instaurado pelo público consumidor – ainda que posteriormente estimulado pelo próprio titular – soando como um verdadeiro termômetro de penetração e apelo social.
Tais apelidos, registrados ou não perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), têm o condão de, com o passar do tempo, tornarem-se altamente distintivos não apenas perante o público-alvo, mas também junto ao público em geral, agregando enorme valor à marca. Via de consequência, embora sejam capazes de atribuir maior popularização e viés propagandístico, carregam o ônus de tornar o sinal mais sujeito a reproduções e imitações no mercado– além de alvo mais corriqueiro de terceiros inescrupulosos, que enxergam uma “oportunidade de ouro” de associar sua imagem àquela da marca “apelidada”.
Neste contexto, merece destaque recente decisão proferida pela Justiça Federal Especializada do Rio de Janeiro, envolvendo imitação da marca “BMW”, corriqueira e carinhosamente abreviada como “BM”, tanto por consumidores quanto pelas próprias concessionárias. Após o INPI ter concedido registro para a marca mista “EuroBM”, para identificar serviços de assistência em veículos, e sendo infrutíferas as tentativas de resolver o imbróglio amigavelmente, o Grupo BMW ajuizou ação visando não somente a nulidade do registro espúrio, mas também a retirada do sinal infrator do mercado.
A tese encampada foi de que as marcas violadas são popularmente conhecidas pelo acrônimo “BM”, porém em manifesta referência a “BMW”. O caso concreto reuniu vultosos extratos de websites com grande circulação de internautas, como fóruns de discussões automotivas, o Instagram e o Mercado Livre, além de declarações e demais provas atestando tal status.
O caso, não se nega, continha outros elementos que demonstravam a má-fé do titular do registo, como a utilização de “Euro”, como prefixo, remetendo a uma suposta origem europeia, e o uso de parte figurativa bastante similar ao famoso círculo da BMW.
Porém, ao julgar pela procedência integral, fato é que o Juiz Federal reconheceu expressamente que a simples evocação do sinal “BM” neste segmento de mercado remetia, indubitavelmente, à marca “BMW”. Verificou até mesmo que “a Associação Brasileira das Concessionárias BMW (“ABBM”), que reúne revendedoras oficiais da marca das Autoras, não contém, em seu acrônimo, a letra “W” no final”.
Diante deste cenário, o juiz considerou que a coexistência dos sinais “EuroBM” e “BMW” no mercado era suscetível de levar os consumidores a confusão ou associação e, portanto, decretou a nulidade do registro para a marca “EuroBM”, além de determinar a imediata cessação de seu uso, sob pena de multa diária de cinco mil reais (R$ 5.000,00).
A recente decisão representa um passo firme e arrojado na proteção de apelidos de marcas famosas.
Além de infração marcária propriamente dita, o juiz destacou que a conduta do titular do registro “EUROBM” prejudicava o direito da Autora de zelar por uma imagem única, ou seja, pela integridade de seus sinais – incluindo o apelido – junto ao público consumidor, afetando indiretamente a estratégia de manutenção da distintividade de um ativo de propriedade industrial tão importante. Ou seja, a sentença também se destaca por ter reconhecido e aplicado a teoria da diluição (Art. 130 da LPI).
A sentença transitou em julgado no dia 09/08/2019, estando apta a ser executada.
Vale salientar que esse entendimento não é novo, e na verdade já foi objeto de discussões envolvendo as marcas “BMW”, inclusive em ação de infração contra o uso do sinal “BMPOWER”. Neste contexto, o Juiz considerou como notório o fato de que a utilização da sigla “BM”, seguida de qualquer nome, tinha o claro potencial de violar a marca “BMW”.
De qualquer forma, a recente decisão representa um passo firme e arrojado na proteção de apelidos de marcas famosas, além de nortear a conclusão de que esse tipo de sinal representa fortíssimo ativo dentro do patrimônio intelectual de uma empresa – restando mais do que justificadas medidas rigorosas visando a sua defesa no mercado.
*Yannick Schweizer e Caio Richa de Ribeiro são advogados Dannemann Siemsen